Meu nome é
WhatsApp, sem sobrenome, ou melhor, da Silva. Pode ter um sobrenome mais
sofisticado, como Niemeyer, Balzac, Flaubert, por aí. Tenho o apelido famoso de
Zap para os íntimos. Sou o maior sucesso do momento. Tomei conta do mundo.
Ninguém fala mais nada a não ser enfiando o meu nome em sua vida. Nem Robinson
Crusoé foi mais admirado.
Tornei-me parte
das pessoas. Hoje em dia, consultam-se ou contratam-se médico, advogado,
dentista, especialista em tudo, sapateiro, jornalista, lixeiro, motorista,
cozinheira, faxineira, diarista, consultor, assessor, tudo por meu intermédio.
Sou motivo para os agentes de trânsito multarem os motoristas, com justiça ou
injustamente, porque nisso eu arrebento mesmo, sou prejudicial: onde já se viu
multar sem autuar? Só aqui no Brasil mesmo e eu estou promovendo tal balbúrdia!
Mas, como ia
dizendo, tomei conta do mundo. O sujeito vai ao Japão e fala com você que está
aqui no Brasil, instantaneamente, sem gastar um mísero centavo. Há 20 anos,
quem diria que tal proeza pudesse acontecer, a transmissão de notícias boas que
andam ou as ruins, que voam, por intermédio de um nome iniciado com a letra Y,
que sou eu?
Sou um canal de
tudo: amizade, inimizade, furtos, roubos, assaltos, acertos de contas, fugas
das cadeias e, principalmente, brigas e, mais com profundidade, crimes. Ajudo a
distribuir drogas, vendendo-as, a polícia nem vê. Imagino que até o terrorismo
está se beneficiando de mim. Se vivesse hoje, Osama bin Laden me usaria para
mandar ameaças ao mundo ocidental.
Mas também, sou
uma senda que transmite lindas orações. Faço bons e maus contatos e promovo
estupros, pedofilia em série, transmito o bem e sou um caminho para rogar
pragas nas pessoas. Sou canal até dos analfabetos, que nunca aprendem a
escrever, ofendem a língua descaradamente, mas resolvem, sim, mandar recados
via áudio ou vídeo. Eu me faço de elo que produz sinceridade, falsidade,
compreensão, insensatez, paciência.
Por incrível que
pareça, provoco raiva nas pessoas pelas mensagens desagradáveis que costumam
enviar e, também, o contrário, prazeres pelas boas-novas. Promovo a ira por
alguém nunca dar resposta a perguntas úteis ou fúteis, ou urgentes, ou
dispensáveis. Estou naquele aparelho esquecido, ou perdido, guardado na bolsa,
cujo dono ou dona não está nem aí. Existem aqueles que só têm o meu canal no
seu aparelho, mas esse equipamento fica encostado o quanto quer. Sou o meio de
comunicação desses egoístas, muito comuns no mundo atual, que só querem me usar
quando realmente necessitam.
Ah... estava me
esquecendo: eu revelo a cara dos caras de pau, mostro a estampa dos que nunca
leem as mensagens recebidas, às vezes recados urgentes, como “estou na forca,
venha me salvar”, mas mandam outras, às vezes enfadonhas, repetidas, antigas mensagens
sem olhar o que chegou. Também são notáveis os tais “fakes news”, que foram,
neste 2018 quase findo, o meu concorrente em popularidade. Os produtores de
“fakes” só não ganham de mim, nunca ganharão, porque transmito mensagens verdadeiras
e boas também, e aí está a diferença porque eles só cometem barbaridades
imperdoáveis.
Faço o amor, a
amizade, a compreensão, a separação e o ajuntamento. “Ama-se pelo Zap e trai-se
pelo Zap”, escrevem os literatos até de parede de banheiro de rodoviária. Por
falar nisso, esses banheiros foram extintos na categoria de porta-mensagens,
acabei com eles. Sou fio condutor de textos famosos, como “Cem Anos de Solidão”,
de Gabriel García Márquez, ou até via de transmissão de zombarias contra os
mulçumanos , os “Os Versos Satânicos”, de Salman Rushdie.
Não tenho que me
declinar. Fora falsa modéstia! Torno-me um narcisista sem medo de errar. Devo,
sim, proclamar a verdade que todos sabem: promovo-me à condição de O PERSONAGEM DE 2018.
Acredito que
continuarei sendo o melhor também de 2019, 2020... 2100... até inventarem um
aplicativo que ensine as pessoas a comer no prato do outro à distância, e
invadir, à força, a vida alheia. Mas tal forma indiscreta de fuçar a intimidade
do próximo ocorrerá por via transmissora exatamente minha, o ser mais orgulhoso
e útil e chato e convencido que já chegou à face do Planeta Terra: minha
majestade o WhatsApp da Silva.
José Sana
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