Brincadeira de adolescente quase muda
o cenário de disputas eleitorais há 62 anos
Ano de 1962. Carrego, além centenas de queijos para a
venda em Itabira, 17 anos de idade nas
costas. E , sem carteira, dirijo um jipe,. Subo a quase intransitável Rua
Santana, íngreme e esburacada. É essa a minha tarefa quinzenal, enquanto penso
no que fazer da vida. Nesse tempo quase todo mundo trabalha e não
estuda. Sigo a regra.
Politiqueiro, sim. Já dizem que enxergo longe, certo
ou errado, fazer o quê? A monotonia da vida faz mal à saúde, dizem médicos e
entendidos. Gosto de ver as disputas.
Tudo na vida é conflito, controvérsia, do futebol ao aprendizado escolar. Quem
é o melhor de bola? Quem é o melhor da classe? Quem namora a moça mais bonita?
Além de negociar queijos, resolvia problemas, ora no
Banco Comércio e Indústria, ora na Tipografia Novaes, ora em Magalhães e
Companhia e no comércio animado de Zé
Rosa, que se torna meu amigo. Se duvidarem, perguntem à Rosário Rosa, lenda
vida do ensino itabirano.
A cabeça voltada para as eleições, entroso-me com as
agitações itabiranas. Meu amigo Carolino Salles, “danielista” de carteirinha,
conta-me casos e causos interessantes. A atenção que dá a todos o barbeiro Seu Minô, atleticano de belas
conquistas, desde os tempos dos “Campeões do Gelo”, também entra no contexto
Mas o maior interesse pelas disputas eleitorais itabiranas ocorre a partir de ficar esperando
a impressão de notas fiscais para o Bazar São Geraldo, de meu pai, Tãozinho, e
outras encomendas de meu avô, Seraphim Sanna, ambos de São Sebastião do Rio
Preto. Seu Emílio, dono da Tipografia Novaes, rompe-se do fundo de sua
indústria trabalhosa e proclama quem
deseja ouvir: “Este ano as eleições em
Itabira vão terminar empatadas”.
Os candidatos a prefeito Wilson do Carmo Soares, José
de Oliveira Machado (Jodi) e Caio Martins da Costa enfrentam-se no palco daquela quente idade
média (até hoje é assim). Saio dali com os nomes dos próceres gravados na
memória: Wilson, Jodi e Caio. E havia um candidato a vice-prefeito, José
Machado Rosa, eleito neste pleito, sozinho na chapa. Na época, os
vice-prefeitos tinham disputa individual.
Inspirado no atrito de Itabira, peguei um pincel e saí
na madrugada de São Sebastião pichando muros, casas e barrancos a torto e a direito. A frase era uma só, que
virou cântico popular: “Tô com Wilson,
“Jodi e Caio e daqui não saio. Além dele, o famoso “Vote em Wilson, Jodi e
Caio”.
Aí veio a confusão: São Sebastião do Rio Preto era
distrito da comarca de Conceição do Mato Dentro, na época distante e sem
estradas. Em Conceição disputavam Jorge Safe e Francisco de Almeida Costa. As
cédulas aceitavam até palavrões dos mais indecorosos.
O alvoroço se estabeleceu e balançou nas contagens de
votos em Conceição — “Vote em Wilson, Dodi e Caio” chamou a atenção dos
contadores de votos. Além de São Sebastião até em Santo Antônio do Rio Abaixo
pingaram votos alienados. É claro que esses receberam o carimbo de “nulos”. Mas
agitaram.
O resultado: primeiro, as patadas porque a briga
estava acesa. Depois, a vitória de Wilson Soares por 3 votos de frente sobre
Jodi Machado. Aos trancos e barrancos
foi forçada a recontagem de sufrágios,
enquanto patadas seguiam-se agitando os chamados correligionários. A recontagem
deu 4 sufrágios a mais a favor de Wilson.
Segundo fonte fidedigna, que trabalhou nas apurações
itabiranas, houve ainda uma tentativa de
inserir 100 votos ilegais contra Wilson Soares, mas o juiz de Direito Dr.,
Clarindo Silveira, descobriu a tramoia a tempo e proclamou vitorioso o real vencedor, Wilson do Carmo
Soares.
Algo ficou confirmado: Emílio Novaes era “expert” em
previsões, um profeta tipográfico mais novo que Nostradamus. Ele acertou no
chamado “empate técnico”. Também, as brigas na porta do fórum deram a noção de
que as eleições daquele ano terminaram “em... patadas”.
Agora chegou a vez de alguém dizer: “As eleições deste
ano (2024), em Itabira, correm o risco
de ficar em...pancadas ou patadas Tomar que reine a paz e que vença o menos
egoísmo”.
José Sana
Em 17 de agosto de 2024
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