sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Os Vei, os Mais Que Vei e a fila dos Vei


Antigamente, quando os Vei e eu éramos novim in foia falavam que o futuro é nosso. Hoje, no entanto, já somos o passado sem futuro. Conclusão: não tivemos tempo de vida nenhum, apenas uma ilusão fosca de esperanças das únicas que não são as últimas mortas,  nem que se perdem. A nossa sorte é somente entender que a vidinha que levamos é uma piada. Sendo piadinha de salão, vamos rir dela e do governo que suga de nós o que pode.

A demagogia governamental não tem idade, cabe em todos os tempos. Os homes lá de cima vivem prometendo coisitas pros Vei e nem os salários desses são equiparados ao mínimo que se paga neste país de salário mínimo. Em outras palavras: a cada  ano o reajuste do salário menor de todos é feito em percentuais infinitamente superiores aos dos Vei. Um dia os Vei  vão ganhar menos de um salário pequetitito. Que vergonha brasileira! Somente essa história basta para nem tolerarmos político nenhum.

E lá se vão os Vei sofrendo pela vida afora sem querer e sem parar. Nós, Vei, entramos numa repartição pública qualquer — banco, lotéricas,  INSS, clínicas, hospitais etc. — e lá deparamos com uma placa estupidamente enganadora: “Atendimento Prioritário”. A fila dos Vei faz curva pelas redondezas das ruas, esquinas e praças. As outras filas têm três, quatro, cinco caixas ou guichês para atendimento. Culpa de quem? Resposta: dos que não sabem que hoje os Vei são maioria absoluta. Este é um país que dizem ir  para a frente mas que só anda para trás como verdadeiro caranguejo profissional.

Pior para os Mais que Vei. Esses penam mesmo! Além do mini-salário que recebem são obrigados a pagar cuidadores ou cuidadoras para acompanhá-los para o resto da vida, com nenhuma esperança de se ver livre  dessa magnânima companhia, a não ser quando se despedir de tão maligno mundo. Mesmo maligno, ninguém quer deixá-lo. Ou o maligno é apenas o governo? Para os que escolheram uma casa chamada de melhor idade, coitadim de nois, para levar os piores dias, é assim: enfia a mão no bolso da família toda e veja se comporta. No caso do asilo, fica lá o salário, fora a frieza de ter somente um ou dois amigos para o resto da eternidade terrena. E fora o pau neles dos críticos que não perdoam: “Coitadim dele, a “familha” deixou ele jugado!”  

É um verdadeiro paradoxo o que dizem da tal de felicidade. Nunca ela dura. Quando dura, equivale ao tempo da supressão da dor. Se os Vei acreditam nela é porque chegou o tal de Alzheimer, companheiro maldito, que apaga a memória de um e reacende a de outros e mais outros. Dizem: “Coitado!” Verdadeiramente, coitado, sim, dos Vei que ficaram para cuidar do Mais que Vei.

Os Vei das filas estão sendo enrolados até pelos seus companheiros de mofo nas lotéricas, bancos e repartições. Enquanto esses Veins não têm como inventar velhice, as pessoas tomam meninos emprestados para levarem com elas, ou arrumam muletas e bengalas para inventar uma perna torta ou quebrada. Outro dia uma menina de uns 13 anos  entrou na minha frente na fila prioritária do Banco do Brasil. Não resisti: olhei pra ela em tom de “Cê tá me passano pra trás, hein minina!”, mas ela manjou e logo soltou a sua frase antecipadamente decorada: “Pega aqui na minha barriga procê vê pruquê entrei aqui!” E eu perguntei a mim mesmo: por que estou nesta malvada fila? Será que tenho dinheiro aqui neste banco?

A história do mundo é assim mesmo: não vale a pena ninguém nem o Vei ter dinheiro, a não ser para gastar, queimar, sapecar enquanto vive. Guardar só serve para dar briga no futuro entre os seus supostos descendentes. Os Vei não têm boteco, cinema, baile, viagem, roupas, carros e namorados (as). Cabe a eles decidirem o que fazer com a danada da grana. “Num deixa pra famia mamá, viu” – tai um aviso que precisa ficar na cabeça dos Vei.

Não é preciso falar de mais passagens da vida dos Vei. Basta sempre lembrar das filas de bancos e outras repartições. Além de haver  apenas um guichê pros Vei, humilhado pela correria dos Futuros Vei, tem a moleza das muiés e dos homes Vei. Eles levam o cartão na capanga com uma senha anotada num pedaço de papel higiênico. Para achar e passar para o atendente ou a quem estiver de companhia é um deus nos acuda. Os Vei têm por costume ficar conferindo o dinheiro que vai pagar ou o troco recebido. Andam com muita moeda e o Vei mal enxerga que valor que é. Até cheira o dinhirim...

“Sê Vei num é fácio não”, disse o Seu Izé ao Seu Juão. Mas a resposta pode vir de supetão e fatal: “Pió é sê nuvim e morrê quando tá na hora do bem-bão!” 

Saia desta, meu chapa!

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

As coisas findas, lindas, também são abençoadas, segundo Drummond



(Discurso proferido por mim na noite de Prêmio DeFato 20 anos, em 23/11/2013, em Itabira)

Ao ser convocado a pronunciar algumas palavras neste evento histórico, perguntei a mim mesmo: o que externar, o que explicar ou o que dizer? Nada mais teria  a acrescentar: a festa não é de quem se afastou, mas daqueles que entram em cena.

Talvez tenha que deixar escrito nesta história a repetição mais que necessária de agradecimentos perenes.

Agradecimento a Deus, sim, não apenas porque permitiu a realização de um sonho bem amplo, do começo ao meio e por estar abençoando o seu desenrolar.

Agradecimento, sim, aos que sempre caminharam ao nosso lado, tanto os colaboradores diretos como outros inimagináveis para os quais não foi possível conhecer a história que ainda se desenrola, principalmente a minha companheira de vida, Marlete, que soube se integrar ao sonho com relativa facilidade e tomar a frente desta obra.

Agradecimento, sim, aos milhares de leitores que chegaram sedentos de informações no transcorrer de quase 18 anos de trabalho incansável, seja na forma não apenas das autoridades regionais, mas do próprio povo que se espalha em mais de uma centena de municípios mineiros. E de continuarem firmes com os nossos sucessores e com eles comemorar esses passados 20 anos de glória.

Agradecimento, sim, aos que acreditaram ou não acreditaram em nossa audácia, de construir um vínculo que pudesse integrar a região, um modo ou meio de atá-la em suportes vindos de cada lugar, cada pedaço, cada anseio e cada proposta ou promessa.
Agradecimento, sim, não para citar nomes dos que além de acreditar, participaram da construção da caminhada.

Para fazer o real e devido agradecimento, não precisamos recorrer aos momentos de alegria ou de tristeza, às lutas ferozes e aos obstáculos que se apresentavam intransponíveis, nem lembrar as melhores reportagens, algumas que duraram até mais de um ano para se redigir um simples lead, ou seja, o início de um texto.

Apenas recorro às regras básicas ditadas pelo empreendedorismo: o primeiro passo é o sonho, o planejamento, a montagem da planilha de trabalho; o passo seguinte é a execução de cada etapa, a colocação em prática desse sonho e o seguir adiante. Mas e um passo indispensável no conjunto de ações, qual seria?

Muitos caminhos foram tentados. Um deles teve como enredo influenciar pelo menos a dois filhos que, no caminho do jornalismo, a principal exigência dessa proposta, assumissem a frente do empreendimento que não poderia, nunca, morrer. Como nem sempre os desígnios nossos se realizam tal como queremos, por tal estrada não foi alcançado o objetivo. Cada filho seguiu o seu caminho, como é próprio de cada um escolher a própria jornada.

Como sem saber a que conclusão chegaríamos, um dia adentrou a minha sala de trabalho uma pessoa que conseguiu fazer com que deixasse de lado uma de minhas inadiáveis  tarefas diárias. E pelo dia e até no limiar da noite surgiu a troca de informações, ideias, pensamentos, no narrar das experiências. Constituiu-se esse um pequeno passo à frente, embora despretensioso. Essa pessoa tem um nome quilométrico, tão grande quanto a confiança que nela depositamos desde o primeiro instante: Kelly Cristina Duarte Eleto Landim. E foi a ela e ao seu irmão, Marcelo Duarte Eleto, que entregamos, confiantemente, o futuro da revista.

Como filho adotivo de Itabira por mais de 45 anos. Como ser completamente entrosado nos costumes e na cultura itabirana. Como amante de seus valores, que são incontáveis, ao encerrar devo citar os nomes dos que seriam dentro das leis naturais, os nossos seguidores.  Kelly e Marcelo Eleto e torná-los responsáveis por várias partes deste projeto, incumbidos de não deixar a peteca cair. Que sigam à frente

Digo que me lembro de uma construção inigualável de Drummond, o representante máximo de nossa cultura no mundo, não pelo final que parece nostálgico, mas muito mais pelo sentido de perenidade dado ao poema

MEMÓRIA

Amar o perdido
deixa confundido
este coração.

Nada pode o olvido
contra o sem sentido
apelo do Não.

As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão

Mas as coisas findas
muito mais que lindas,
essas ficarão.


Obrigado.

(Obs.: Este texto foi “enxugado” para se enquadrar nos 3 minutos exigidos para a sua leitura. Mas acabou sendo mais resumido ainda e falado por tópicos, de "improviso")

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

O mundo tem um problemão, mas os seus habitantes se dedicam a resolver os probleminhas


O mundo começou numa verdadeira desordem. Terra, água se misturando, seres brotando do chão, os primeiros que habitaram o planeta. Ninguém reparou que desde o passo inicial entrou em vigor várias leis que se perpetuaram: de transformações e de evolução. Quer dizer que Charles Darwin tinha mesmo razão, apesar de se passar longos anos ouvindo desaforos e até sendo humilhados. Somente agora, morto que está, a humanidade o consagra como um grande cientista, talvez o maior de todos, o que deu mais luzes à descoberta de nossa origem numa época de plena escuridão.

Descendentes ou não do macaco, pouco importa. Só quer dizer que já fomos hipopótamos, rinocerontes, monstros, macacos e outros bichos, tudo isso está provado pela ciência, que ainda se debate para concluir como foi o início, se foi um big-bang ou se existiu mesmo o casal Adão e Eva. Esses tão econômicos que só tiveram dois filhos. E o pior: dois homens. Piorando mais: um matou o outro. Haja lógica nessa história, menos real que a da Carocinha, Lalau Lili e o Lobo, Branca de Neve e os Sete Anões, e a lenda da Mula Sem Cabeça.

Temos que começar do princípio total ou do meio para desvendar a nossa própria origem? E para saber o que estamos fazendo aqui neste mundo enrolado, o que devemos fazer? E o que fez este complicado mundo chegar a um ponto cada vez mais confuso? Eis aí o problemão a que me refiro no título deste texto. Problemão abandonado, deixado de lado, pouco caso total e absoluto do ser vivente. Para tornar-se ainda mais misterioso, deixamos o tempo rolar irresponsavelmente. E cuidamo-nos de tratar das questões de somenos importância, os probleminhas como brigas, guerras, criar terrorismo, debates desnecessários, perda de tempo, ingenuidades pouco interessantes.

Se somos pessoas organizadas, ao começarmos o dia, listamos as ações que precisamos resolver, classificamos todas em lista de mais importantes ou prioritárias, e partimos para a procura de soluções. Todos acordamos dia após dia com o problemão, que é, espontaneamente deixado de lado. E, então, vamos procurando resolver as picuinhas, pagar as contas no banco, comprar alguma coisa que falta na casa, consertar a fechadura da porta da rua, fazer revisão do carro, comprar um presente para alguém e por aí vai. Ao chegar ao final do dia, pegamos a lista feita na parte da manhã e analisamos se todos os itens tiveram solução e quais os que foram empurrados para o dia seguinte.

E o tempo passa  irreversivelmente, vamos ficando cada vez mais velhos, vêm os cabelos brancos, as rugas, conseguimos levar os dias e as noites com certa dose de expectativa sobre o que pode acontecer imediatamente, preocupamo-nos com a saúde da família e com todas as importantes ou frívolas atividades. Mas não chegamos ao problemão nem que a onça beba água. Ou se  começamos a  pensar a respeito do problemão, logo aparece um amigo ou amiga que diz algo sobre religião ou falta dela, focaliza os mistérios, fala que a nossa missão não é essa.

Tudo bem se  pensamos que a nossa incumbência não é resolver o enigma ou pepino  ou rabo de foguete. Mas todos sabemos que, cedo ou tarde, quer queiramos ou não, temos que um dia partir para uma nova postura porque quem vai desvendar, cedo ou tarde, o mistério mais importante da humanidade será nós mesmo. 

E fim de papo.

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Não são cruzeirenses. São os depredadores



A origem do nome Bárbaro nada tem a ver com a violência, como hoje o utilizamos em nosso vocabulário. Quanto menos Vândalos, parte do que compunha o universo bárbaro.  Eles eram originários da Alemanha no tempo do Império Romano, que eles próprios ajudaram a derrubar no Ocidente. Mas qualquer povo da época seria um lutador físico por excelência e não somente por serem bárbaros. Foram eles até aliados dos romanos durante um bom tempo.

Com base na citação do parágrafo anterior, diria que aquela multidão incalculável que ocupou ruas e avenidas de Belo Horizonte nos dois últimos dias, com tonalidade azul, não era composta de Bárbaros subdivididos em Alanos, Saxões, Suevos, Francos, Lombardos, Visigodos, Ostrogodos, Anglos e Saxões, e Vândalos, mas, principalmente, os Depredadores, os mesmos que mataram, machucaram e acabaram com lojas e outras construções ao longo do trajeto dos jogadores que desfilavam depois de conquistar, na quarta-feira, o título de Campeões Brasileiros de 2013.

Se são cruzeirenses, acho que não, talvez uma parte.  Se alvicelestes, são igualmente depredadores, porque não foram apenas os 20 detidos pela polícia, como informou a mídia quase completa, inclusive o jornal argentino “Olé”, mas praticamente a multidão que quebrou, empurrou, destruiu e até matou. E não apenas por maldade, mas por simples jeito de ser, porque toda multidão é destruidora por si só, apenas para garantir o direito de sobrevivência ou a simples e compreensível vontade de viver expressa em Shopenhauer como símbolo de sua filosofia.

Apenas vinte pessoas não se multiplicariam pela Grande BH completa. Diria que foram no mínimo 200 os que quebraram uma parte da loja de troféus do Clube Atlético Mineiro, no Bairro de Lourdes. E somente 150 foram atendidos no Pronto-Socorro João XXIII. E as multidões se multiplicaram por toda a região metropolitana, provando, nos saques e quebra-quebras, que havia uma multidão bárbara no sentido hoje empregado e não naquele em que esmiuçaram e dilapidaram o Império Romano do Ocidente.

Um dos entraves para se resolver a violência no mundo é o próprio analista dessa violência. Ainda insistem a mídia e as autoridades constituídas que “apenas uma minoria participa da violência urbana.” Carregando no lombo uma mentira desse tamanho, o pobre povão ou povinho — esse sim, é a minoria — nunca haverá de viver a plena paz que passou da época de deixar como herança aos filhos e netos. O fim da era que vivemos só se concretiza com o próprio reconhecimento dela.

Nesta semana e nessas condições, deem um título de campeão brasileiro ao Íbis Futebol Clube e ele arrastará multidões às ruas e avenidas de nossas cidades. E no meio do povaréu aparecerão não os 20 que a mídia decantou como detidos pela polícia, mas os milhões que ficaram no anonimato e que em tempo algum serão descobertos como destruidores dos dias e noites de terror vividos por Belo Horizonte e seus arredores. Se aceitarmos verdadeiramente a alcunha plantada pelo atleticano Roberto Drummond em seu vocabulário futebolístico, a “China Azul” seria praticamente toda criminosa, depredadora, violenta e bárbara. Como não existe esta fantasmagoria de China de Cor Nenhuma, temos que trabalhar contra a verdadeira violência que nos acomete porque...

...quem destruiu, matou, arruinou, desgraçou e violentou grande parte de cidadãos mineiros e bens patrimoniais e públicos foi, então a China Azul. Bem que um dia, em Conceição do Mato Dentro, em época não muito distante, tive que  dizer ao saudoso Roberto Drummond: “Você é perfeito até para chacotear a vida de nossos rivais!”