Foi
assim... ela chegou como uma disfarçada ajudante de pedreiro, ou de serviços,
ou de escritório, tudo parecia um pouco de cada coisa. Não estávamos abrindo
vaga para ninguém trabalhar na construtora, isto mesmo, não recrutamos nem um
entregador de material, quanto menos uma “fuçadora” de propriedade alheia. Todo
mês uma casa pronta, do projeto de arquitetura ao estrutural e à maquete, e da
busca de material na praça à entrega à incorporadora para dar andamento às vendas, enquanto na
parte da entrega até eu mesmo ajudava. Só não era incumbido de receber os
valores que garantiram, por 17 anos e mais alguns meses, o conjunto
habitacional com seus 200 ou mais unidades prontas e utilizadas ou habitadas.
É
bom lembrar que a incorporadora garantia, com as suas vendedoras competentes —
e botem competência nisso — as vendas antecipadas. Esses eram um dos pontos
seguros do alicerce das construções ou
mesmo dos projetos. Fora isso, na verdade, na pequena mas forte empresa, havia e
há os ajudantes, esses que trazem ou traziam material — seja areia, brita,
pedras, cimento ou tijolos e telhas — e o colocava ao meu redor para que o pegasse e o montasse, enquanto havia quem
executava, sob os meus olhares, os projetos elétrico e hidráulico.Paro
para pensar e, realmente, construíamos, bem ou mal, uma casa de 30 em 30 dias
durante quase 20 anos. Antes disso, tinha participado de outras empreitadas, do
trabalho de ser empregado à tarefa de me transformar em patrão. E que patrão
engraçado! Tão engraçado que passei o dia conversando com ela, a ajudante de
qualquer coisa, que perguntava sem parar, numa curiosidade de fazer inveja à
Candinha ou a um Jô Soares das 8 às 20 horas.
Na
minha ignorância funcional, pouco desconfiei de que estava sendo entrevistado
para, em pouco tempo, alguns meses mais precisamente, ela me tomar, na maior
classe e naturalidade, o cargo de construtor. Este que vos escreve, eu mesmo,
tomei a iniciativa de torná-la responsável diretamente pelas minhas ex-tarefas,
com a minha discreta supervisão. E até que um dia ela se tornou, oficialmente,
a gerente terceirizada da empresa.
Naturalmente,
não deu certo. O que na roça eles chamam de arrendamento — e é isso mesmo —
tornou-se inviável porque havia bem escancarada uma falta incrível de
horizontes. A
construtora não é uma fazenda, com pastos e outras plantações, como de milho ou
feijão, mas uma empresa preparada para erguer, mês a mês, uma casa, às vezes um
prédio de apartamentos e lojas, e não tinha os mesmos objetivos e
características.
Então,
ocorreu o que já era previsível: ela, que chegou como ajudante, na verdade se
tornou gerente para, então, se erguer como proprietária, nos deixando, naquele
instante, não totalmente encostados, mas, no meu caso pessoal, como uma figura
sem função, um apenas ajudante de retoques finais e mensais, diria um auxiliar
de acabamentos, e que se sentava por um tempo com a equipe para contar
anedotas, tal como uma Rolando Boldrin.
Contudo,
naturalmente, deixei de fazer os retoques. Chegou exatamente o mês em que a
construtora dizia que mais precisava de mim, mas, como numa maestria de atitude
singular, resolveu esquecer isso, evitou me “reconvocar”, ou me desconvocou sem
palavras, apesar de ter-me colocado e insistido pela participação.
Agora,
salvo algum sinal natural que deve vir por aí, deixarei naturalmente a parte do
relaxamento. Mas se percebe, gentil e naturalmente, que devo tornar-me também
naturalmente uma página virada do passado, nada mais que um dos fundadores ou
inventores da construtora e incorporadora sana ilimitada. (CIS).
E
vou encerrar por aqui, apenas deixando o meu agradecimento: muitos empresários
com filhos ou sem filhos não conseguiram deixar a empresa funcionando ao chegar
ao fim das atividades. Podemos nos orgulhar, a esta altura do tempo, que, mesmo
com cinco filhos e oito netos e nenhum deles tomando parte, hoje, deste projeto
de empreendimento, termos sido beneficiados por substitutos naturais como se
fossem da mesma família, os quais
garantem o pleno funcionamento das empreitadas.
Fim. Então, foi assim...
ela chegou, pegou, assumiu e, de nós —
construtora e incorporadora —, tomou naturalmente a direção. Que vou descansar,
juro que não, mas tenho absoluta certeza de que de empregado a patrão, seja
fazendo guloseimas ou remexendo argamassas, agora não sou nem um nem outro. O
futuro a Deus pertence e Ele sabe o que quero porque estou conectado ao que Ele
quer, mais uma simbioses natural de uma vida de sentidos e vibrações.