quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

HISTÓRIA VERÍDICA DO INACREDITÁVEL (Capítulo 2)

Em clima de desconfiança e incerteza

Rodoviária cheia, passagem na mão para Belo Horizonte, Antonieta dá um pulo ali pertinho e vai buscar um “quebra-galho” para acalmar o estômago. Eram quase 18 horas e tinha saído da casa de Nancy sem o café da tarde. Trouxe pasteis e refrigerante, mostrando, num rodopio de saia e uma meia pose de alguém que quer mostrar disposição, que o recreio era para todos. Seria a festa de despedida? Abre o saquinho plástico cheio de guloseimas e o coloca em cima do banco forrado, dando sinal para a turma vir comer a pequena refeição, enquanto deixa os copos recicláveis ao alcance de todos: Karen, Aninha, Adília e Wilton, além de Nancy e de sua filha Karla, a comitiva que foi despedir-se dela. Em um minuto, cada um estava meio lambrecado de gordura, que pingava como goteiras e com os lábios untados também de coca-cola, bom para desinfetar, dizem os maldosos e sem maldade.

Para agradar a turma, desta vez é Karen quem busca outra rodada de pastel de queijo e carne e uma embalagem dupla de guaraná, aí, sim, acredita que todos estarão de estômago forrado. Mais gordura, mais tempo para a despedida, mas, finalmente, a farra acaba depressa. Hora da saída do “cata-jecas”, apelido dado pelo espertinho caçula de Karen, o Wiltinho, ao ônibus até certo ponto confortável. Tem até banheiro dentro dele.

— Não gosto de pegar ônibus nesta rodoviária, Karen! — reclamou Antonieta, que já estava acostumada com a cidade e achava que tinha o direito de colocar defeitos nela. E resmunga  numa de suas muitas repetições, com voz arranhada (ela tem uma voz de taquara rachada, sempre diz Karen):
— Em minha cidade é bem melhor. Por isso quero levar vocês todos para morar lá... (rsrsrsrsrsrs).
Nancy tentou dar razão à amiga:

— Contam que essa espelunca (essa pode falar porque nasceu na terra) foi inaugurada em 1965, quando Cata-Prego não tinha sequer 50 mil habitantes. Agora, com mais de 100 mil, as obras que aqui fazem são meras gambiarras. Pequena, sem conforto e até ofensiva ao potencial da cidade. O pior: nem prometem construir outra. Triste, minha amiga — concluiu, complementando: — Mas fazer o quê? Os políticos vivem um momento de extrema falta de inspiração nesses tempos. Nielsen fala sempre na rádio (ele tem um programa numa emissora da cidade).

— O pior exemplo de politicagem vem de Brasília. Os de lá são bem piores! — ajudou Karen.
— Que nada! — exaltou a paranaense, petista até debaixo d’água — vamos mudar de assunto?
Antonieta recebeu e concedeu muitos abraços e beijos, lágrimas saíram e caíram nos panos e guardanapos e até se misturaram à gordura dos pasteis. Entrou no ônibus e se foi de Santana do Cata-Prego para Belo Horizonte, de onde partiria à noite para São José dos Pinhais, região metropolitana de Curitiba. De BH até Curitiba, viagem noturna que ela adora quando não vai de avião. Quando o ônibus virou a última esquina, primeiro gritos múltiplos de “tchau” e, em seguida, o aceno com uma das mãos do adeus e até Karen que, por dentro parece uma pessoa muito forte, deixou que pelo menos  duas gotas de lágrimas rolassem fronte abaixo, cada uma brotando em seus castanhos olhos.

Enquanto Antonieta elaborava planos para um novo mundo, graças à amizade que construiu com Karen, essa pensava alguma coisa da amiga de quase última hora que fizera nesses últimos dias. Ela chegara a comentar com a sua filha mais velha, Ana, sobre ter gostado muito de Antonieta, achou-a muito interessada em sua vida, atenciosa, gentil, participativa, simpática, mas para o seu gosto um tanto quanto pegajosa. Só isso de defeito, imagina e resmunga, falando por falar. 

Daqui para a frente os assuntos seriam outros, parecia a  preocupação acerca do início das aulas dos filhos no segundo semestre e de seu trabalho bem puxado, como sempre. Não é à toa que ela ganha um bom dinheiro, precisa ajudar o marido a estudar os filhos que entram numa fase difícil de preparação para a vida. Como todos já sabem, Karen é vendedora em uma loja na cidade. E vendedora que ganha prêmio todo mês e todo ano, A Vendedora do Mês. Ou do Ano.

Quando o ônibus já estava fora da cidade, Antonieta, um pouco golpeada pela emoção da despedida, pega o celular para enviar a primeira mensagem via WhatsApp ou Zap-Zap, como dizem popularmente: “Mto prazer, amiga, em te conhecer e em manter contigo essa linda amizade. A convivência nossa foi e é um luxo. Bjus”. A resposta demorou um pouco. Antonieta já confere a cor azul, ou seja, sinal de que havia chegado ao destino a mensagem. Karen deixou passar mais um pouco, estava ocupada, mas acabou dando a sua resposta: “Oh... o prazer foi td meu, bjus”. Ao receber a primeira mensagem, ainda na estrada rumo a Belo Horizonte, Antonieta não se conteve e voltou a entrar no assunto em que ela tanto estava interessada: “Karen, não se esqueça de que vai conhecer o Marcos”. Desta vez não teve resposta. Mas, sim, um comentário de mãe para filha:

— Não sei por que Antonieta deseja tanto que eu faça amizade com um amigo dela.
— Isso é veneta dela, mãe!. Não se incomode! — suspirou a filha mais velha, demonstrando claramente que está amadurecendo e pode aconselhar a própria mãe.

A viagem para o Sul não teve contatos. Nem quando Antonieta chega à Rodoviária de BH. Durante a viagem vai-se a madrugada e todos querem dormir.

Lá no Sul do país a nova amiga acaba de chegar. Férias vencidas, amanhã será o dia de retorno ao trabalho. São José dos Pinhais é uma cidade muito animada, 200 mil habitantes que mantêm um povo muito educado, cordial, amigo e solidário. Não é uma cidade de clima quente, pelo contrário, o Sul é bem morno, ou melhor, mais para frio que para qualquer temperatura.

— Olá, Mãe! – Como vai a senhora? Com saudade de mim? — este foi o seu cumprimento à genitora que a recebia na porta da casa. Entendem-se bem. Ela se chama Das Dores. Nome de cartório e pia batismal: Maria das Dores. O pai, não gostam que citem o nome. É mais um daqueles sumidos na vida. Normal hoje, as pessoas, ao invés de morrer preferem desaparecer. Uma boa ideia, diriam os espertinhos. E Seu Neco deu no pé sem deixar notícias há mais de dez anos.

No dia seguinte, 5 de agosto de 2008, Nieta tinha duas tarefas importantes a executar: reapresentar-se no seu trabalho, agora com endereço novo, um escritório no Shopping de São José dos Pinhais e retornar à aula no segundo grau, à noite. O educandário atende do maternal ao segundo grau e conta com uma ampla estrutura física, que contempla laboratórios de informática, ciências e inglês, sala de arte, biblioteca, cozinha experimental, parque, horta e ginásio poliesportivo, entre outros espaços cuidadosamente planejados. Antonieta adora o ambiente, os professores e os colegas.

Saltitante, ela chegava ao trabalho toda motivada. Apesar da saudade, tinha essa  atenuante para assassinar a distância dos amigos que fez em São José.
— Oi! – ela diz para todos com os quais cruza em escadas rolantes e elevadores.  E era correspondida plenamente. Não alonga conversa com ninguém, exceto com Vera, uma amiga que trabalha numa loja de presentes ao lado, gente boa, magrinha, baixinha e feinha, mas pelo menos confidente. Ah, confidente! Antonieta tem algumas e com elas exercita a sua capacidade de esconder um assunto do outro. E ela fica apenas tentando entender o que fazer com a vida dos outros.

— Depois eu quero te contar as novidades lá de Minas Gerais! – sugeriu Antonieta.
E  a feinha:                                                    
—Já estou curiosa porque você sempre traz novidades de lá. Vamos marcar um encontro no  próximo fim de semana?
— Vamos, sim – eu te ligo ou você  me liga.

Lá e cá. Começa agora a saudade a ser assassinada via internet. É a tecnologia. Até pouco tempo atrás o ser humano dependia drasticamente de um carro próprio para se locomover ou ainda tem que pegar um coletivo ou táxi. Agora ele é mais necessitado da telefonia celular ou móvel do que tudo. Nas ruas, avenidas, casas, no transporte, até ao volante, o ser humano se tornou um eterno dependente da comunicação via celular. A cada dia, com novas tecnologias, os smartphones vão sendo cada dia mais indispensáveis. Há quem diga que não consegue mais imaginar como o mundo até há poucos anos viveu de recados, gritos, atéma toques de tambores, como nos filmes de Tarzan.

 E mensagens começam a chover entre as duas novas amigas. São José dos Pinhais a Santana de Cata-Prego e vice-versa, mais insistências do Paraná para Minas Gerais do que o contrário.

E entram no ar as novas mensagens via Zap-Zap:
— Boa tarde, amiga Karen. Td bem por aí?
— Td ótimo. E aí?
— Comecei no meu novo local de trabalho aqui em Pinhais. Estou gostando muito. Só me incomoda a saudade de Cata-Prego. E de vocês todos, principalmente de você.
—Vc acostuma rapidim, amiga! Aqui vc já conhece. Vivemos a maior monotonia.Tudo de bom para vc!
— Obrigada!

E sempre, sempre, sempre. A cada instante chegam mensagens mas, sem novidades:
—Bom dia, Karen!
— Bom dia!
— Olhe, querida, hoje recebi um SMS daí informando que vc está se separando do seu marido. É verdade?
— Puxa! Que notícia desagradável deram a vc!. Não tem nada disso. Tudo bem aqui.
— Então, me desculpe, meu bem!
— Nada a desculpar. Isso não está nos meus planos. Acho que não. Quem sabe Nielsen esteja pensando nisso e não me falou?

Tentando acreditar que a notícia lhe abriria as portas para uma possível entrada do amigo de Antonieta, o Marcos Aurélio, a moça lá do Paraná cutucou:
—  Não se assuste! Esses homens de hoje são fogo, viu? — Antonieta demonstrava que a informação teria vindo de um homem ou que ... sabe lá o que ela pensava...
— Não, Nieta! Poupe-me desta. Estou com a cabeça boa, graças a Deus, meus filhos estão meio agitados com os estudos. Prefiro a vida em paz para conseguir levar tudo direitinho e ajudá-los.
— Foi alguém daí da sua cidade quem mandou um SMS pra mim, minha linda! Mas vamos deixar isso pra lá. Também não quero desagradar a sua vontade. E torço para a sua felicidade.
— Bye!
— Bye!

Na verdade, Antonieta aguarda ansiosamente por uma notícia desse tipo: Karen separada de Enéias, cuja cara nem pôde apreciar, ou seja, nem ficou conhecendo. Era a sua obsessão acabar com o casamento, quem não via isso nela? Que desejo esquisito! Todos pensavam assim. Antonieta parece uma verdadeira louca desde quando ficou conhecendo pessoalmente a Karen. Ela só fala em Karen, Karen, Karen. E a amiga dela  virou sua obsessão.

Parece que por ressonância magnética os fatos se comunicam. Inacreditavelmente, nos mesmos dias Karen iniciara com Nancy uma troca de ideias e pensamentos. Essas, porém, usavam o smarthphone apenas para marcar um bate-papo. Dificilmente expunham as suas ideias, fossem as que fossem, via on line. Chegou o dia em que Karen não aguentando mais de tanto assédio – e logo de uma pessoa do mesmo sexo – resolveu ir à casa de Nancy, que conhecia mais do que ela a paranaense, procurando um desabafo.
Vejam o diálogo:

— Oi, Nancy, estou louca para conversar com você sobre um assunto delicado — começou a andar de um para o outro lado, ingeriu meio copo de água e voltou ao tema: — gostei muito da sua ex-funcionária e amiga, mas estou me sentindo assediada por ela. Você nada percebeu?
— O quêêêê? Você tá doida? Que é isso, minha filha? Corta essa!
— Quem sabe seja um pressentimento apenas, tomara! Mas ela está muito pegajosa e cheia de expressões exageradas — querida, minha linda, até de gostosa já me chamou.
— Não, acalme-se! Ela é assim mesmo. Depois de acostumar com você volta ao normal. (rsrsrsrsrs). Você está imaginando coisas. Despreocupe-se porque eu a conheço bem, pelo menos nesse aspecto. Mas se acha que algo está exagerado, corte o lado dela, uai!
— Tem outra coisa meio esquisita: ela insiste em quer me apresentar a um rapaz amigo do namorado dela. Como se chama? Nem sei...
— Geraldo Bonifácio.
— Ah é, esse nome bonito (rsrsrsrsrs)...Então, dois fatos nos fazem acreditar que ela é normal: querer arrumar namorado pra você, mesmo sabendo que você é casada, e ter um namorado. Esse lado cupido dela não conheço. Corte logo e acabe com o papo, uai!

Pronto. Um copo de água encerra essa conversa tranquilizadora. Karen voltou para casa devagar, matutando, absorta nos seus mais profundos pensamentos ao passar pelas ruas estreitas da cidade em que nasceu e que adora. Pensando foi que estabeleceu as suas verdades dentro de si. Concluiu de si para si que estava, ultimamente, vivendo pelas conversas de outras pessoas, mesmo que bem intencionadas. Infelizmente, ou felizmente, cada um tem que ser dono de si, comandar o seu próprio nariz.

Foi, então, que resolveu adentrar o seu novo quarto de dormir e montar as pedras angulares de sua vida. Pegou um papel, um lápis, trancou a porta, puxou a cadeira junto a uma mesinha e começou a anotar. A técnica tinha aprendido por aí em inúmeros cursos e palestras que viu. Adotou o que aprendera com Dale Carnegie, em um de seus livros  de “como fazer alguma coisa” (“Como fazer amigos e influenciar pessoas” ou “Como evitar preocupações e começar a viver”), algo assim. E anotou:

“— Meu marido e eu estamos separados amigavelmente e apenas de corpos.
— Meu marido e eu estamos vivendo na mesma casa na maior santa paz.
— Meu marido e eu temos filhos para cuidar e acertamos que cuidaremos deles. Ele e eu amamos muito os nossos filhos.

— Eu quero viver a minha vida. Se puder ou precisar  um dia sair de casa, se não for para prejudicar os meus filhos, se der levar esses filhos, se assim continuar em paz com o meu marido que é uma ótima pessoa, tudo será feito em paz e com as bênçãos de Deus. Amém. Amém. Amém.”

quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

HISTÓRIA VERÍDICA DO INACREDITÁVEL (Capítulo 1)

Ocorrência que promete ser a melhor do ano

Estamos, eu e mais algumas pessoas, em Santana do Cata-Prego. Nada de carpinteiro existe por aqui, apesar do prego. O que vejo são morros, ruas estreitas, trânsito maluco, pernilongos, dengue demais e um exagerozinho de crimes de todas as naturezas. Só falta a poeira para empatar de 8 x 8 com Itabira. Portanto, a terra do minério de ferro está vencendo de 9 x 8. Mas o berço de Drummond pode perder a partida depois de umas peladas de rua que começam em meados de 2006, ou 2008, por aí. Vamos à frente e prometo ser o mais preciso possível, apesar de obrigado a ofuscar nomes e até detalhes de feições para não caçar briga com ninguém. Nem ser caçado.

Fique calmo você que me lê. Prometo narrar a história de forma clara, leal e sucinta. Vamos aos fatos:

— Ih, nossa!
— O que foi?
— Estou me sentindo mal. Acho que preciso ir ao Pronto-Socorro.
— O que há com você, Enéias?
— Estou meio tonto, mulher!
— Quer ir mesmo?
— Vamos aguardar... acho que tenho um pouco de febre... te falei que quase não dormi esta noite, Karen.
— Acho que você deve ir mesmo. Vou chamar um táxi agora.
— Então, tá, pode chamar.

O carinho de um com o outro era notado por muita gente. Muitos e muitos anos de paz, amor e ternura. Não parecia que já faz em torno de 15 anos de matrimônio. Os dois trabalhando, cada um no seu canto, em muitos anos juntos, sempre vendendo alguma coisa e Karen sempre se mostrando uma excepcional vendedora. O marido mais dado ao escritório de contabilidade de que era sócio. Ele, ela e os filhos Ana, 13, Adília, 11, e Wilton, 7. Alguma coisa que pudesse abalar a união? Parece que não. Se havia, ficava guardado entre as paredes da casa, simples mas muito bem cuidada, as filhas também ajudando e a “patroa” sempre foi exigente. O garoto ainda pequeno, uma criança quase de colo.

O rapaz, com os seus 37 anos por aí, Enéias, foi levado de táxi para o Hospital São Geraldo da Piedade, casa de saúde que sobrevive a duras penas com ajudas daqui e dali,  crises contínuas que sempre vêm com ameaças de fechamento. A mulher, verdadeira esposa do lar, mesmo trabalhando fora, mantém toda a juventude dos seus 34 anos bem contados e vividos. Casou-se antes dos 20, enfrentou a onça da vida difícil e cara de Cata-Prego e acabou formando uma família de três amados e delicados filhos. No hospital foram dias difíceis. Houve momentos em que os amigos de Enéias, na cidade, convocavam-se uns aos outros porque corria boatos de que ele estava mal. E, na verdade, “a coisa tá feia”, segundo palavras desses amigos fiéis.. E foram vários dias ou até meses de sofrimento naquele verdadeiro pardieiro em que o Hospital São Geraldo da Piedade se naufragou. Sopravam algumas enfermeiras nos corredores: “Estamos nas mãos das traças”. A solidariedade, todavia, crescia dia a dia, os amigos chegavam, gente das duas famílias arregaçavam as mangas e, finalmente, o moço sorriu, voltou ao trabalho e se mostrou completamente curado.Apesar da demora, o seu caso foi chamado de “milagre”, pois Enéias não teve diagnosticada a doença que quase o levou para o outro lado da vida.

Assim os dias se passaram. A casa ficava sempre cheia de visitas à noite. Afinal de contas, Santana do Cata-Prego sempre teve uma comunidade solidária, apesar de alguns deturpadores da situação, os quais sempre os há. Grandes amigos da família desde muitos anos, sempre aparecia por lá o jornalista/radialista Nielsen Moreira, o conheço bem desde os tempos de sua chegada à cidade.Trata-se de um rapaz de uns presumíveis 40 anos, sempre ajudado na vida pela esposa, Nancy e pela filha Karla. Foi através de Nielsen, que sempre batalhou para não perder a luta da vida, que vários problemas se resolveram Por isso ele tem a mulher e a filha ao lado conduzindo uma lanchonete e através dela ampliando a expectativa de almoços bem temperados que, aos poucos, se tornam cada vez mais deliciosos e famosos.

Até que um dia, Nancy ficou conhecendo uma peça diferente, de outro estado, do Paraná e da cidade de São José dos Pinhais, região metropolitana de Curitiba. Antonieta chegou, não era uma moça bonita, mas tinha simpatia, mesmo meio prosaica, loira ou ruiva, 1 metro e 49, por aí, magra, corpo bem cuidado, uns 29 anos. Ela foi procurar emprego na lanchonete que servia pratos no almoço e hamburgeres o dia todo, e acabou conquistando a confiança da família Nielsen-Marilda-Karla. Assim o tempo foi passando. Nada a ver a moça loira ou ruiva do Paraná com o casal descrito no início, feliz, cujo chefe de família passara um bom tempo sofrendo no hospital da cidade, acho que a cidade só tem um ou, sei lá, podem ser dois hospitais e algumas clínicas.

A monotonia da vida continuou nesta história. Nada especial aconteceu durante cerca de dois anos. Nesse tempo, a moça paranaense foi embora, deixando o emprego e com marca de boa amizade na família de seus patrões. Até por que Nielsen, Nancy e Karla sempre conviveram e convivem bem com todos. Ao avaliar, depois, o caráter de Antonieta, a quem às vezes tratavam Nieta, havia somente elogios para ela, principalmente nas redondezas da lanchonete daquele bairro um pouco agitado de Santana do Cata-Prego, o Esperança. Foi embora a moça e muitos por ela perguntavam. Mas, extrovertida e cheia de vida, correspondia com as pessoas e mostrava que tinha saudade da terrinha em que viveu por mais de dois anos. Tanto que um dia retornou para passear. O passeio foi tão bem aproveitado que ela ficou durante trinta dias hospedada na casa dos seus ex-patrões.

Foi assim:

— Cheguei! Que saudade! — um abraço bem apertado no pessoal da casa. Nielsen, como sempre alegre, sorridente, um gentleman, ficou feliz com aquela presença. Nancy nem se fala e também a adolescente Karla.

— Seja bem-vinda! — a receptividade da dona da casa foi de deixar a visita à vontade. Essa visita foi logo avisando:
— Vim aqui para matar a saudade! Vocês me conquistaram. Mas prometo não incomodar, nem demorar muito. Estou de férias. Tenho um trabalho num shopping em São Carlos com dia marcado para retornar.

Nada, nada, nada de protocolo. Antonieta, a menina de São Carlos, já era muito querida da casa. Ela não precisava se explicar demais, fora funcionária da lanchonete durante um bom tempo. Agora havia retornado à terra natal e, depois, a Cata-Prego que a conquistara, segundo ela, definitivamente. Por causa de uma presença mais livre na cidade, andou pelos morros e ruelas da cidade, fez mais amizades, encontrou com as velhas companhias conhecidas até que, enfim, foi apresentada por Nancy à esposa do Enéias, aquela que vive bem com o marido, na alegria, na tristeza, na doença e com os três lindos e inteligentes filhos. O encontro foi uma espécie de amizade à primeira vista. Elas se amarraram num papo longo que durou o horário do café da tarde e até de uma saída a uma igreja por perto para umas orações protocolares.

Tanto foi que ambas se entenderam que, no dia seguinte, Nancy flagrou Karen tratando Antonieta de simplesmente “Nieta” e pensou consigo mesma: “Para 24 horas de amizade, ou nem isso porque ambas dormiram, chamar de um diminutivo já era um grande progresso para uma amizade”. No entanto, nada a temer na cabeça de Nancy, afinal se Karen era bem casada, as duas eram mulheres. E, com certeza, também não lhe veio a ideia de um “amor gay”, muito na moda nesses tempos loucos, segundo principalmente as gerações passadas, mas fora de cogitações pelo que conhecia a sua ex-funcionária, agora hóspede de poucos dias.

— Vem cá, Karen, vamos assentar aqui para conversar. (Estavam na casa de Nancy).
— Espere aí, Nietinha, já vou, um minuto só... de que vamos tratar? (A proximidade da amizade passou de encurtamento do nome para um diminutivo carinhoso.

— Olha, minha amiguinha, vou viajar amanhã para minha terra, precisamos anotar os nosso endereços todos e combinarmos uns detalhes. Não são apenas os números que temos, mas outros e outros. E eu queria fazer a você uma surpresa...
— Ah é? Eu adoro uma surpresa, Nieta! Faça de uma vez.
— É o seguinte: tenho um amigo em João Pessoa, no Piauí, que gostaria de apresentar a você.
— Não entendi, minha filha. Me apresentar? Nos cafundós do Piauí? Você deve estar brincando, né querida?
— Não, ele é amigo de meu namorado, de minha  cidade, que se tornou amigo dele e meu em João Pessoa. Vou explicar melhor: o meu namorado, Ladinho (Geraldo Bonifácio) morou em João Pessoa e formou-se em mecânica metalúrgica com ele.E convidou ele para mudar-se para São Carlos para trabalhar numa montadora de veículos. Ele, Marcos Aurélio, que fiquei conhecendo, é um cara que você deve querer para você durante toda a vida.

Karen pigarreia de propósito:
— Que é isso, minha filha? Não estou procurando nem namorado nem amigo! Estou tranquila com a minha vida!
— Pensei que o seu casamento estivesse balanceando, na corda bamba!
— Olha, todo casamento parece que balança um dia, no outro conserta. A minha vó sempre diz que “casamento bem feito balança mas não cai”.
— Pense bem se não quer conhecer o Marcos. Vamos conversar pela internet. Aqui está o meu Zap, o Face, e-mail etc. Me dá o seu aí.

Pronto. As duas estavam ligadas. Prometeram se comunicar sempre. Uma enviando mensagens e telefonemas de São Carlos, trabalhando num shopping como secretária de uma empresa, com o seu queridíssimo Ladinho, e a outra em Santana do Cata-Prego, Minas Gerais, numa loja de muito serviço, movimento e prestígio, ao lado de sua família adorada. Afinal, Karen tinha que ajudar o marido a cuidar da família e os filhos entrando numa idade de muitos gastos nos estudos.

Na hora de partir para a longa viagem, no entanto, com cautela, a loira paranaense não aguentou e fez a pergunta melíflua:

— Posso pedir ao Marcos Aurélio para entrar em contato com você?
Karen mergulhou-se num mais turvo pensamento: “Ah, não! Por que essa minha amiga, tão boa, de que gostei tanto, insiste tanto nesse tal de Marcos Aurélio?” E ficou cabisbaixa na hora do abraço de despedida. Parecia cair uma lágrima do olho de Antonieta. Diante disso, não teve uma alternativa, gaguejou um pouco, prolongou a sua capacidade respiratória e acabou cedendo:

— Tá bem, tá bem! Ele pode me mandar uma mensagem por e-mail, depois vejo se dou resposta. Mas, por favor não passe o meu número de celular para ninguém.

Antonieta se apressou para não ouvir nem mais uma negativa e disse, por último:

— Foi bom demais conhecer você. Falamos depois. Tchau!

— Tchau!


(Não percam o próximo capítulo)

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

UMA HISTÓRIA VERÍDICA DO INACREDITÁVEL (Prefácio)

EXPLICAÇÕES NECESSÁRIAS

O fato é verídico e sem uma vírgula de ficcionismo. Aconteceu e pronto. Os nomes próprios aqui usados são, sim, o máximo de invencionismo, porque a situação não permite que se dê nenhuma pista para um eventual constrangimento. Qualquer semelhança que as pessoas adotarem como imaginação da verdade pode colidir com o desvio de assunto. Se a história é inacreditável, mas é possível, não há como ser mentira, sem conjecturas. Faz em torno de quatro meses que tomei conhecimento de seu desfecho. Tive um choque quase pré-agônico, porque já acompanhava o seu desenrolar no decorrer de certo tempo: sou amigo dos verdadeiros protagonistas, um casal que mora na cidade de Santana do Cata-Prego, além de outros personagens.
                    
O nome Cata-Prego insinua claramente que é criação talvez de um próprio personagem. Podia ser Mar sem Água, Rio das Paixões Perdidas, Cafundó do Judas, Mariposa da Serra e outros mais. É apenas um carimbo sem valor nem importância. O que é certo aqui, intocável e irrefutável, é o enredo. Aconteceu um fato que durou seis anos e seis meses. Durante todo esse tempo foi recheado de “amor”, paixão, emoção, fascinação, ansiedade, abnegação, ilusão, afeto, favor, dedicação, impaciência, sofreguidão, incerteza, perfídia, traição, amizade, inimizade, esperança, decepção, conflito e sei lá mais o quê. Enfim, todos os ingredientes que compõem as chamadas novelas das 7, das 8, das 9, das 10 em diante e até de filmes. Filmes de ação, aventura, comédia, comédia romântica, comédia dramática, comédia de ação, suspense, romance, drama, fantasia, ficção científica, ficção normal, policial etc.

Nunca escrevi sobre esse gênero misto e sequer sobre histórias longas ou mesmo tamanho médio. Seriam os filmes de longa metragem ou média? Curta, não. Tem um pouquinho mais de letras, como diria um amigo meu que detesta ler, porque, afinal, chega a mais da metade de uma dezena de anos. Alguém amou desesperadamente durante esse tempo, com uma fidelidade daqueles que acreditam ser o amor um eterno sentimento e se ele acaba não era amor. Alguém praticou um verdadeiro crime por ter-se incorporado à vida, caráter, personalidade, sentimentos de um ser fantasma. Mas houve de tudo, menos sexo, até mesmo um beijo, sequer um selinho e, olhe lá, quem duvida que nem aquela cena de aperto de mão ou toque de mão? Um fato é verdade também: declaro de bom tom que há alguns chamados “fakes” e o próprio eventual leitor, se eu os conquistar, verá que são falsos dentro do bojo da história e não aqui numa telinha ou num eventual papel.

Mas prometo com todas as minhas forças que esta narrativa, com toque de um romance pobre em literatura, reconheço, terminará consagrando a verdade, ao contrário das novelas e filmes, quase sempre fechando as cortinas no tal “final feliz” inventado. Tenho a autoridade de quem conhece o transcurso deste inacreditável acontecimento, por tê-lo acompanhado na sua essência e somente tomado o verdadeiro susto no final inegável. Assumo que quem se atrever a ler com cuidado sentirá um frio na barriga e fará uma avaliação do fato. Mas ficará eternamente perplexo diante da realidade estarrecedora que veio fechar com chave de um suspiro parecido com alívio, embora com um rancor sem destinatário. Afinal, um personagem verdadeiro tem um defeito indefinível.

Fica assim, então, vamos aos fatos pingados à medida de sua audiência na internet. Quem sabe sou obrigado a acelerar? Ou pisar no freio? Ou manter no chamado “ponto morto”? Quem ler determinará. Até o Capítulo 1.

domingo, 13 de dezembro de 2015

ENTREVISTA COM A ONÇA DE SÃO SEBASTIÃO

Foi assim... a onça apareceu e a minha prima Míriam Sana, tremendo da cabeça aos sapatos, a fotografou. Ela, confiável e muito, viu, mas estremeceu. Com isso a imprensa chamou a Onça de São Sebastião do Rio Preto de Suposta, acrescentando-lhe um prenome duvidoso. Ora, a Onça existe e a entrevistei. Com um pouco menos de medo, meu Sapo preferido, que fica debaixo da ponte e bate matraca a noite toda, conversou com ela, ajudada por um Gambá que se tornara amigo da onça de verdade.
                       
O encontro com esse segundo maior felídeo neotropical do Brasil foi marcado para o Estádio João Rodrigues de Moura, recentemente reinaugurado, exatamente na linha divisória do gramado. O horário não tive escolha: às 5 horas da madrugada, quando mais da metade dos habitantes locais de seres humanos estão dormindo. Para garantir a minha integridade, o Sapo da Ponte da Rua de Cima e o Gambá da Rua de Baixo ficaram no meio entre ela e eu. E ela é ela mesmo, do gênero feminino, que hoje exerce o cargo mais alto de protetora dos últimos selvagens com o nome simpático de Rainha Onça.

Tudo pronto, vamos ao bate-papo:

ZÉ DO BURRO — Querida Onça, que novidade é essa, vocês aparecem aqui em São Sebastião do Rio Preto?
RAINHA ONÇA  — Não é novidade. Estávamos nas imediações há muito tempo. Somente agora vocês, muito lerdos e bobos, estão nos vendo.

ZÉ DO BURRO — A senhora conhece bem o povo desta cidade?
RAINHA ONÇA  — Claro. Conhecemos toda a região. Eu, por exemplo, me desloco para uma área de 10 km2 a 40 km². Esta é a nossa característica.

ZÉ DO BURRO — Mas eu insisto nisto: a senhora andou sumida. Agora está aparecendo em lugares simultâneos. Isso é planejado pela sua raça?
RAINHA ONÇA  — Sim, porque o meio ambiente está permitindo. Nós sentimos que o ser humano está mais acessível e anda nos proporcionando mais espaços. Disseram outro dia, numa reunião de vocês, que a nossa vida vale mais que a vida dos antigos mandões.

ZÉ DO BURRO — A sua turma já sabe que todos sabem disso?
RAINHA ONÇA  — Temos informantes em todos os locais.

ZÉ DO BURRO — A senhora sabe que o Geraldo Quintão está doido pra fotografar a senhora?
RAINHA ONÇA  — Oh!!! Por que você não o trouxe? Fale pra ele que estou às ordens. É aquele moço novo mas da cabeça branca que transporta escolares? Estou à disposição...

ZÉ DO BURRO — O que mais está facilitando a aproximação de sua turma?
RAINHA ONÇA  — Vamos citar alguns pontos: vocês não empreendem mais aquela caça terrível; terminaram com o desmatamento e deixam que a floresta continue descendo para a cidade e parecem com um pouco menos de medo de nós.
ZÉ DO BURRO — O IBGONÇA fará um senso “oncígeno”. A sua comunidade pretende ajudar?
RAINHA ONÇA  — Ainda não fomos procurados. Logo quando os entrevistadores chegarem aqui tomaremos as medidas e deixaremos até que uma turma nossa acompanhe vocês nesta mini-floresta.

ZÉ DO BURRO — Em que cidade da região a sua população é maior?
RAINHA ONÇA  — Aqui em São Sebastião, porque temos mais montanhas em volta da cidade. Nas outras cidades também existimos, mas há outras raças, como a preta e a pintada.

ZÉ DO BURRO — Vocês se entendem bem entre si — pardas, pretas e pintadas?
RAINHA ONÇA  — Quando a situação está difícil, a briga é sempre muito acirrada. Neste momento, estamos nos desentendendo um pouquinho. Contudo, a possibilidade de reconciliação deve acontecer porque estamos nos infiltrando nessas cidades, mais compreensivos que são os seus habitantes. Acho que não vai faltar comida para ninguém.

ZÉ DO BURRO — A senhora fala da crise econômica do Brasil?
RAINHA ONÇA  — Isso, a crise está por enquanto começando, ouço esse comentário por aí. Espero que não vá adiante.

ZÉ DO BURRO — Alguns idiotas que querem amenizar dizem que vocês são as tais jaguatiricas, mais parecidas com gatos. Há essas por aí?
RAINHA ONÇA  — (risos)... Vocês estão vendo... Olhe bem pra mim e veja se tenho alguma coisa de jaguatirica!...

ZÉ DO BURRO — Para matar a fome, a senhora já comeu alguém desta região?
RAINHA ONÇA  — Olha, não posso falar de todas as nossas turmas que estão espalhadas na região, mas entre Passabém, São Sebastião, Santo Antônio, Morro do Pilar, Itambé do Mato Dentro, Carmésia e Ferros, temos feito abstinência de carne humana, por enquanto.

ZÉ DO BURRO — A abstinência vai acabar?
RAINHA ONÇA  — Isso eu não sei porque temos uma diversidade muito grande de onças famintas. Espero que a situação não fique difícil demais.

ZÉ DO BURRO — O que estão comendo?
RAINHA ONÇA  — Cães, gatos, bezerros, galinhas e pequenos animais similares. Mas existem outras presas. Somos predadores de 85 espécies de animais diferentes e estamos no topo da cadeia alimentar. Temos mandíbulas fortes e somos os únicos felinos que matam suas presas perfurando o crânio com os caninos, podendo até rachar cascos de tartaruga. A habilidade em nadar está relacionada com a proximidade da água. Aqui na região temos muitos rios, mas estão praticamente secos. A natureza morre aos poucos e isso nos prejudica muito.

ZÉ DO BURRO — A sua turma tem preferência para caçar animais domésticos ou selvagens, ou humanos?
RAINHA ONÇA  — Com a fome nós comemos de tudo. Mas podem ficar tranquilos, contribuímos e muito para o equilíbrio ambiental e de segurança. Acho que as cobras são muito perigosas para vocês e estamos destruindo uma a uma. Quanto às preferências de seres humanos, é claro que preferimos os mais gordos. Ninguém entre nós gosta de gente magricela.

ZÉ DO BURRO — Uma cunhada que tenho, a Sininha, me disse que na comunidade do Porto, que ela e sua irmã Magui chamam de capital, vocês estão mandando mais que a turma de lá. É verdade?
RAINHA ONÇA  — Para falar a verdade, não sei. Estive no Porto somente uma vez, mas lá temos alguns chefes que comandam. Vou saber deles...

ZÉ DO BURRO — Por que quem manda agora é a senhora e não a Onça macho?
RAINHA ONÇA  — Vocês devem ter ouvido falar da expressão “no tempo do onça”, não é? Naquele tempo quem mandava era a Onça macho. Agora somos nós, as fêmeas.

ZÉ DO BURRO — A senhora acha que o mundo vai bem?
RAINHA ONÇA  — Na selva, sim, vai muito bem. Mas entre vocês estamos vendo que tudo está uma avacalhação muito grande. O Brasil deixou de ser um país sério, no Oriente estão matando e jogando fora — que desperdício! Ali mesmo em Itabira, o pau está quebrando. Paramos de ir ali de medo de sermos caçados.

ZÉ DO BURRO — O símbolo de São Sebastião é o Gambá. A senhora se importa de a cidade mudar para Onça Parda?
RAINHA ONÇA  — Não me importo nada, mas não gostaria de desagradar ao meu amigo Gambá. Ele gosta de cachaça mas eu prefiro a carne. Só se fizermos uma sociedade e isso não depende de mim. Mas temos outras pendências ainda a resolver.

ZÉ DO BURRO — Muito obrigado por esta entrevista.
RAINHA ONÇA  — De nada. Estou sempre às ordens. Precisando de mim, falem com o Sapo da Ponte. Ele me conhece muito bem. Ou com esse Gambá da Rua de Baixo. Em caso de necessidade, podem procurar o prefeito que é nosso amigo, o Antônio Celso, ou o Zé Eugênio, gente boa. Zé Eugênio, aliás, seria o último dos habitantes do planeta Terra que comeríamos, por ser magro demais.