Estamos em que
ano mesmo? Dois mil e dezesseis? Não, engano, o ano de verdade é 1960, o mês de
junho, o dia 14 e a hora, podem anotar, 8h30. Aconteceu no Estado do Rio de
Janeiro, perto da Estação de Japeri, precisamente no km 71, o fato a seguir: um
trem de pagamentos de funcionários-ferroviários da Estrada de Ferro Central do
Brasil (EFCB) praticou o maior assalto a mão armada de todos os tempos neste
país. Valores incalculáveis pelos números de hoje, em torno de 20 milhões de
cruzeiros, foram surrupiados. Agora pulamos, de verdade, para o ano de 2016 e o palco é uma pequena cidade do interior de Minas
Gerais, classificada entre as menores do mundo. Oh dó! Cinquenta e seis anos depois
evoluírem de São Sebastião do Rio de Janeiro para São Sebastião do Rio Preto!
Tal como o Trem
Pagador, que rendeu um filme dois anos depois — e até uma forte candidatura a
Oscar em Cannes, na França, e a centenas
de prêmios — o comboio tinha hora certa
para sair e pagar, como no mês passado, em Passabém, e agora em São Sebastião.
Dois bandidos, ou lambedores de rapadura, já foram devidamente algemados e
remetidos às grades. Um fugiu, mas, coitado, está no mato sem cachorro, a
delação, sequer premiada, ou pressionada, deve trancafiá-lo. O cronograma de
ação deles revela que em novembro foi
Passabém, dezembro São Sebastião, ficando a certeza de que em janeiro seria
Santo Antônio do Rio Abaixo. Esse é, realmente, o sinal forte do chamado crime
organizado, premeditado e com ares de doutorado no caminho.
Vamos esquecer o
Trem Pagador carioca ou fluminense, cujo desfecho entrou na lista feita pela Associação
Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine) dos 100 melhores filmes de todos
os tempos no Brasil. E nos concentrar devidamente no caso de 7 de dezembro de
2016, em São Sebastião do Rio Preto. Acredito que o Assalto ao Carro Pagador,
ou ao Correio que paga, renderá mais um filme da prima Regina, nome artístico
Afra Sana. Ela não estava presente, girava pelo Brasil afora, mas já sabe o que
fazer. Um helicóptero sobrevoou a região à procura dos assaltantes e do
dinheiro, claro. Geraldo Quintão conseguiu filmar, às tremedeiras, o sobrevoo
de um helicóptero da polícia.
Notável e
lamentável o acontecimento. Mas para quem, como eu, não consegue tirar da
memória os fins de festas ou de simples domingos na pequena Vila, lá pelos anos
antigos, não é novidade. Antigamente, São Sebastião era assim: dado o fim de
uma cerimônia de festividade religiosa, o povo armava na rua a confusão mais
esquisita que se pode imaginar. Poeira subindo, animais empinando, tiros
pipocando no ar. Tudo normal e poucos se importavam, menos eu que tremia em
cima dos sapatos. Trabalhava como caixeiro ou balconista do Bazar São Geraldo,
de Sebastião Cândido F. de Almeida, com ele escrevia, meu pai. Via cavaleiros
entrarem montados numa porta de comércio e saírem em outra. Nada acontecia além
disso, senão gargalhadas dos testemunhas nada amedrontadas.
Na rua, o espetáculo
continuava. De vez em quando acertavam a orelha ou o pescoço de alguém. Alguns
levaram balas corpo afora, sem morrer, ou morrendo de verdade. Havia também
espetáculos dos mais grotescos, hoje chamados 0800, nas praças do arraial.
Certo dia um bêbado da elite aprontou uma peça de teatro digna de um circo
internacional ou diria atração do Coliseu de Roma: fechou a atual Praça
Seraphim Sanna para aplicar chicotadas no pobrezinho do Nhonhô de Albertina.
Nhonhô carregava o apelido de Jabutirica e apanhava sem saber porquê. Como foi
chicoteado naquele domingo e ninguém o socorreu! Sou memorialista preciso: era
4 de dezembro de 1955. As chicotadas doíam e doem em mim como se me arrancassem
a própria pele e não a do Jabutirica de Albertina, essa uma paupérrima doente
sem marido.
Hoje, são ou não
bandidos profissionais, ou metidos a vilões de filmes faroeste que povoam o
palco do circo. Aliás, esses que levaram e deixaram no carro capotado em
Passabém R$ 125 mil, são analfabetos em assaltar, estavam nas primeira lições
sem mestre, mesmo alvejando, por pura imaginação de uma bala perdida, a perna de um conterrâneo que
nada tinha e nada tem a ver com a miscelânia. Fosse eu um dos atiradores dessa
antielite, desistiria na primeira aula. Quem sabe constitui gente boa e não
merecia estar aí? Sei lá! Que façam o seguinte: dedurem imediatamente o
terceiro para que tudo termine num final feliz. São tão carentes que nem
perceberam o fim da munição policial, provavelmente, também, do combustível.
Felicidade para eles “comendo” uma boa cadeia. Talvez tenham participação no
assalto do mês passado, que rendera limpinhos R$ 200 mil!
Antes de
terminar, quero dar um conselho sincero aos ladrões, conselho objetivo e de
boas intenções. É o seguinte: não só o crime não compensa como o assalto também
e qualquer tipo de furto ou roubo. Foi o que uma senhora que não conheço, mas
vi e ouvi, disse: “A vida de ladrão é muito difícil e complicada. Se eu fosse
do meio deles, já teria me conscientizado!” A mulher de nome Dona Maria,
explicou direitinho a forma que deveria servir aos bandidos. Ela disse: “Para
um assalto dar certo, os marginais precisam de muita sorte, além de sangue frio
e inteligência. Conseguindo chegar ao seu reduto com o dinheiro surrupiado, a
hora de distribuir é problemática. Sempre há um sujeito ambicioso, o chefe, que
quer ficar com uma parte maior. Aparecendo quem não concorde com a divisão dos
valores, a probabilidade de atuação da polícia é muito grande. Depois ainda há
o problema da consciência e vou ser bem esclarecida, cada um paga pelo que fez
e faz mais cedo ou mais tarde”.
No fim, aproveitando
o que a simples senhora declarou, sobra sabem o quê? Os que se julgam injustiçados
vão para a imprensa, a boca do povo. Aí foi o mesmo que aconteceu no Assalto ao
Trem Pagador, os do prejuízo acabaram com a festa dos bandidos. De qualquer
forma, os assaltantes que foram presos irão mesmo fazer a devida delação. O
pobre fugiu a pé e será pescado a qualquer momento. Então, era isso o que
precisava dizer hoje e agora: o Carro ou o Correio Pagador de São Sebastião do
Rio Preto vai mostrar, no filme da Afra, que assaltar, furtar ou roubar são
ações de bobocas e babacas. Está fora de moda. Se acha que há desemprego, me
procure que, aos bons de serviço, mostrarei um caminho. E chega de atormentar o
povo simples do interior..
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