De uns tempos pra cá o que mais se popularizou por aí foi a
“fila dos véi”. É o que mais se falam nas esquinas, botecos, velórios e salões
de beleza, embora a fila seja também das gestantes, lactantes, mulheres com
criança no colo, por aí. Chamam de “véi” todos os seres humanos que estão na
faixa acima dos 60.
Pois é. A fila
dos véi, depois de se notabilizar como a solução da compreensão do governo
diante dos problemas dos idosos, supôs-se que fosse superar o grave defeito
governamental de corrigir os vencimentos dos aposentados em níveis abaixo do
salário mínimo. Quem recebe acima de três salários mínimos tem um outro índice,
tão pequenininho que não é visto senão com lupa. Como exemplo, enquanto a
garrafinha de água mineral passou de R$ 1,00 para R$ 2,00, ou seja, 100% de
aumento, a remuneração dos véi não consegue nem chegar nos 7%, uma vergonha que
não pode sequer ser pensada por um ou uma presidente da República sem que a sua
consciência doa até arder.
Então, a fila
veio para compensar o que o governo não quis fazer. Ou seja, o véi entra na
fila de uma lotérica (só paga contas de água, luz, telefone e algumas mais em
caso de apostas), quando chega no seu final é depenado de cabo a rabo. E eu,
que não me acho tão velho assim, apesar de plenamente classificado como véi,
sou obrigado a curtir essa doce presença diante de outros colegas, ou menos ou
mais decadentes. Dos 30 dias do mês, pelo menos em quase a metade deles tenho
que ir para uma lotérica. E vou a um bairro da quase periferia, no Caminho
Novo, mais precisamente à Estrela da Sorte, do meu amigo Marcim do Abílio.
Lá, não demoro
nem um segundo a decidir em qual fila devo entrar. Se tem três véis na fila dos
véi, eu prefiro pegar o rabo de uma compridona que avança para a rua Prefeito
Virgilino Quintão. Porque não é somente pagar e receber, mas fazer um “juguim”
e conferir o outro que venceu. Têm uns ou umas que tiram um saco de moedas e
começam a contar. Outros ou outras precisam digitar uma senha para receber
alguns centavos e levam pelo menos meia hora para cada tecla. Quando se pensa
que o véi será despachado pelas simpáticas funcionárias, eis que elas começam
uma ladainha para vender um jogo a mais, uma fatia de bolão. E são tantas
loterias que correm que eu nem me atreveria a citar uma, pois nem entendo dessas duplas e triplas. Só
cito a Mega Sena, que sempre está acumulada, dizem as más línguas que é foco de
denúncias contra um bando de falsificadores. Não entro nesse pormenor, pelo
menos nem acredito, porque senão não estaria sempre fazendo o meu juguim.
A maldita fila
virou um calvário para os véi apressados. Dizem as próprias vítimas que “essa
fila não anda”. Alguns já fizeram a conta: o atendimento a um véi na sua única
fila chamada de “preferencial” demora o tanto que pelo menos oito são despachados
na fila dos “normais” no mesmo tempo. Os
“anormais”, portanto, congestionam qualquer agência lotérica devido à sua
lentidão corriqueira de fazer as contas e contar o dinheiro. Ao lado deles, há as
mulheres que arrumam meninos emprestados para ganhar preferência. Essas nem
percebem que a tal preferencial fila é mais lenta que tartaruga andando de ré.
Então, não vale a pena, já é certo que a fila dos normais anda mais
depressa que a dos anormais.
Não se sabe que
dia haverá duas filas dos véi numa só agência. Talvez nem haverá, mas o dia a
dia das agências já mostra que urge o aparecimento de uma mudança. O sujeito
aposenta-se rapidamente, já com a cabeça bem
branca, apesar de a idade não ter avançado, entra por ironia na fila dos
véi e contribui com a sua compridez. Duvido que a maioria pense que a fila dos
véi é o pior lugar em que se deve se meter hoje em dia. Muitos seguem pensando
que é o contrário. Assim os véi levam mais tinta ainda na vida, pois a primeira
lata na cara eles tomam por ser véi e a segunda por ser inserido no pior lugar,
numa fila de tartaruga preguiçosa.
Não tenho por enquanto
sugestão para salvar essa pátria aí dos véi tripudiados. Acho que os véi têm que continuar penando
mesmo, porque se eles voltam depressa para casa, suas patroas, ou véias, estão os
esperando para xingar a sua falta do que fazer com aquele notável e desagradável apelido de rabujento.
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