quinta-feira, 16 de maio de 2019

ÚLTIMA CRÔNICA: CADA UM NA SUA ROTA DE FUGA

Anunciei a meia dúzia de eventuais leitores que estaria chegando ao fim estas enfadonhas crônicas. Prometi parceria somente com o computador. Para tristeza deles, resolvo adiar a realização do sonho tipo pesadelo. Se me perguntarem o porquê desta decisão estapafúrdia, deixo a explicação por conta de cada um.

O principal motivo está ligado a uma expressão mais que horripilante popularizada pela antiga Companhia Vale do Rio Doce: “Rota de Fuga”. Hoje em dia, Itabira e sua região mineradora têm mais setas indicando o caminho para que sejamos espertos, ágeis e egoístas que conselhos de paz e harmonia propagados nos templos religiosos. Como no filme “Me pegue quem for capaz”, a Vale dá aulas de como fugir em várias circunstâncias. Serve também para ludibriar a polícia caso no meio dos fujões existam criminosos e bandidos. Já somos proclamados como esses malfeitores. Aceitemos que dói menos, parece nos dizer a dita cuja mineradora.

Se é que nesta vida ainda não fiquei do lado mais fraco, redimo-me agora do pecado  mortal para fazer algumas defesas, com unhas e dentes, pela ordem: os idosos — as leis até me garantem o privilégio de estar eu junto deles; os deficientes físicos de todas as naturezas; as crianças e adolescentes lembrados pelo estatuto próprio, o ECA; os sem pernas, ou os sem braços;  os surdos (e me insiro entre esses) e os surdos-mudos; os cegos; os portadores de síndrome de Down (e tenho uma irmã consanguíneo); os autistas; os complexados de toda ordem; os tetraplégicos; os psicopatas e os a caminho desta situação depois de viver tantos alardes ao som de alarmes; as vítimas de quaisquer problemas que se colocam à margem dos demais; enfim, todos aqueles prejudicados por uma causa congênita qualquer.


Em nome de todos os citados e de algum esquecido, pergunto à poderosa Vale: o que será desses excluídos dos treinamentos que se desenrolam em esperados incertos dias previstos para a tragédia do rompimento de barragens?  Um casal, morador do Bairro João XXIII, resolveu copiar a insanidade da mineradora e expôs defronte sua casa o seguinte aviso, em placa, pintada com arte: “Aqui estamos aguardando a morte”. Ironia? Talvez. E se não for?

E não somente Itabira, berço da velha Companhia, é contemplada com o pavor e o horror. Acrescentem outras cidades, entre as quais se destacam Barão de Cocais, Santa Maria de Itabira, Santa Bárbara, São Gonçalo do Rio Abaixo, Brumadinho, Rio Acima, enfim, onde há ou houve minério de ferro.

Não há o que se acrescentar, senão relatar um aviso conhecido mundialmente depois do fatídico ataque suicida às Torres Gêmeas de Nova York, em 2011:  “A organização fundamentalista islâmica Al-Qaeda declara que habitantes dos Estados Unidos da América do Norte jamais terão paz”. Não se sabe que se sarcasmo do destino, com seus atos inexplicáveis e suas providências cruéis e malucas, a Vale quer se tornar um novo Estado Islâmico ou Al-Quaeda sem Bin Laden e outros comparsas.

Antes de entender a sentença que nos é imputada, como não sou um desesperançado total, resta-me render-me de joelhos em apelo à mineradora:  reveja seus conceitos e ações e nos dê pelo menos um fio de esperança na existência do futuro. Assim, quem sabe, possamos sentir-nos novamente  humanos, tal como Deus nos talhou.

De nossa parte, que sejamos reais e corajosos para recuperarmos a perdida vergonha na cara. Sem medo de ver aonde chegaremos, acreditamos que há um fio dessa esperança vagando à nossa frente. Sigamos esses sinais.

Então, conclui-se que não queremos que a mineradora Vale retorne ao seu tempo de Madrasta, quanto menos de Mãe. Desejamos, sim, que ela  negue a veracidade das centúrias de Nostradamus e, mais ainda, a conclusão mais difícil de ser engolida: que ela não seja a pavorosa  Besta  do Apocalipse. Mas os alarmes bradam como sirenes mortais e não são anjos que sopram seus sons fatídicos. Até quando vamos suportar esse terrorismo?

José Sana
Em 16/05/2019

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