sexta-feira, 29 de novembro de 2019

QUANDO OS NÚMEROS MENTEM NO FUTEBOL

No jornalismo sou de ontem mesmo, mas não de anteontem. No ontem uma reportagem era preto no branco; anteontem era um preparativo; no hoje a maioria dos jornalistas está saindo dos trilhos. O profissional pega os dados e acaba se perdendo neles. Diria que se naufraga. Quero mostrar como exemplo o que dizem repórteres de jornais, rádio, sites e televisão sobre, especificamente, o desempenho do treinador Vagner Mancini no Atlético.

Antes de tudo, esclareço que não sou contra o técnico Vagner Mancini e também não sou a favor. Mas agora vou defendê-lo com unhas e dentes. Ou só com unhas porque ele topou a parada. Isso porque não há treinador bom quando não é ele quem monta seu time preferido. Técnico de futebol não ensina ninguém a matar a bola no peito, na canela, nem cabecear e chutar. Ele apenas vai para a beira do gramado e começa a gritar com os seus comandados. Como exemplo daquele que hoje está endeusado no futebol brasileiro, Jorge Jesus, do Flamengo, não vejo o que fez para ensinar Gabriel Barbosa, Arascaeta, Éverton Ribeiro e outros a chutar, cabecear, passar a bola, fazer gols.

O jornal O TEMPO desta sexta-feira (29) pega os números dos últimos treinadores do Galo e faz as suas comparações: Rodrigo Santana, 48,7%; Vagner Mancini, 36,6%. Pronto. Cita apenas o número de jogos e outros dados além disso: 11 (o repórter errou ao citar dez), duas vitórias e cinco derrotas, mini-currículo de Mancini no Galo. O outro lado, comum em matérias jornalísticas, deu duas linhas para o Mancini assim: “Chegamos em uma sequência de nove derrotas em 11 jogos”. O destaque da reportagem, incluindo o comentário do colunista Roberto Abras, é também injusta. Em síntese, Mancini não fez o milagre esperado pelos cabeças de bagre.

O barco saiu do porto com uma série de avarias claras, e tinha um Sette Câmara mais incompetente  que os marinheiros inexperientes, ou ruins de remo que foram por ele escolhidos. A embarcação começou a flutuar razoavelmente bem, mas logo a seguir mostrou-se  com certa dificuldade diante de vários princípios da física e da geometria. Na verdade, é um navio pequeno, uma embarcação feita de madeira, ferro, aço, fibra,  alumínio, adaptado a vários tipos de propulsão, mas candidato ao naufrágio.


O titanic do Sette Câmara já mostrava entrada de água, risco de afundar-se  ou de desgovernar-se. Tinha um capitão, diria um soldado raso comandando a jornada. Trocaram o comando no meio do caminho. Continuaram escancaradas as avarias e os marinheiros sem a formação necessária eram chamados a fazer o que não sabem. A viagem longa do Campeonato Brasileiro exigia melhores preparações. O navio atleticano já vinha de uma série de afundamentos neste trágico ano de 2019.

Vem agora o analista Thiago Nogueira e quer que o soldado-comandante faça milagre em plena viagem, em alto-mar. Querem que uma nau sem rumo seja ajustada em tempo recorde, já que a viagem não cessa, não se pode voltar no tempo e reparar erros cometidos.  Diria que o único erro ao soldado-comandante Vagner Mancini foi aceitar o desafio e não ter a visão suficiente para recusar o convite do Sette Câmara ou do Rui Costa e dizer o seguinte: “Esse milagre não é comigo, só São Nicolau, que é o protetor dos marinheiros, pode resolver”.

Agora, resta o seguinte: não deixar que a nau se afunde. É uma missão ainda desafiadora. Nos menores enfrentamentos de ondas durante a jornada do atual campeonato houve ameaças de naufrágio. Então, o barco não está salvo, ainda tenta uma necessidade de calmaria para toda a tripulação e seus viajantes que são a imensa torcida sofredora e desrespeitada do Galo. Existem botes salva-vidas, à espreita? Não. E não há submarinos de plantão também. Vamos, então, nos agarrar com o santo protetor. E vamos esquecer de que esta viagem é um cruzeiro, pois cruzeiro que afunda também. As ondas são corinthianas, botafoguenses e coloradas pela frente. Livremo-nos delas e julguemos Vagner Mancini com justiça. Não pela sua competência, nem fama de treinador pé-frio. Se sair bem desta é o São Nicolau consagrado.

José Sana
29/11/2019

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