* Em 1965, sob o "desamparo" da ditadura,
trabalhei no Diário de Minas, extinto jornal que circulava a partir de uma
redação na Praça Raul Soares, em Belo Horizonte, e era considerado a melhor escola de jornalismo do
estado.
*
Aprendi no jornal que 90% das notícias apuradas — e nem todas estavam ao
alcance da imprensa — iam para o lixo, ou seja, não eram levadas ao
conhecimento do público. Notícia divulgada era somente a espalhafatosa ou
considerada mais importante quando era proveniente de fonte oficial... já que
estávamos na ditadura.
*
Como repórter policial, andava o dia todo, desde as 10 horas da manhã. À tarde,
ou mesmo noite, chegava à redação e começava a redigir as matérias. Durante
cerca de três meses, todas as minhas matérias eram arquivadas pelo copidesque.
*
Certo dia, o jornal estampou na primeira página uma matéria que produzi: “Deu
zebra no trânsito” era o título da notícia. Ela se referia ao lançamento de
faixas parecidas com zebras no chão de ruas, avenidas e praças, as quais até
hoje representam o sinal para pedestres. Fiquei quase uma semana sem dormir de
satisfação.
*
Hoje em dia, qualquer notícia sem importância é transformada em matéria
relevante. Basta fazer como um bom cozinheiro faz com o feijão com arroz: um
tempero bem feito não faz mal. A partir daí, a imprensa começou a manipular o
pensamento humano. Muita gente vive hoje pensando com a cabeça da imprensa. A
Rede Globo é a principal manipuladora de pensamento no Brasil, quiçá em quase
todo o mundo.
* E
assim caminha a humanidade. Da mesma maneira que pensamos com a inteligência de
outro, vivemos a copiar pensamentos daqueles que são chamados de gênios. “No
meio do caminho tinha uma pedra/ tinha uma pedra/ no meio do caminho tinha uma
pedra/ no meio do caminho tinha uma pedra”. Se essa primeira estrofe de um
poema de Drummond fosse escrita por mim, jamais seria famosa e recitada em
cafés da moda ou em eventos importantes. Mas quem escreveu foi Carlos Drummond
de Andrade, o que muda tudo.
*
Uma notícia sensacional é o Departamento de Estradas de Rodagem (DER) deixar
São Sebastião do Rio Preto sem campo de futebol durante quatro anos. O futebol
é uma das mais importantes práticas que melhoram a vida da pequena cidade. Por
falta dele, adolescentes e jovens migram para as drogas. Quatro anos é tempo
suficiente para tirar um jovem da sociedade e mergulhá-lo no caminho errado.
Para esse pobre escriba, o DER é um órgão criminoso. Mas para quase o resto do
mundo, é natural, normal.
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