Ipoema é nome
indígena que, segundo os seus moradores estudiosos, significa ave que canta, uma
espécie que tem o habitat no pântano. Era Aliança, já foi Pouso Alegre. Mas não
é o meu tema de agora. Em Ipoema e de
Ipoema já tratei de tudo: coisas boas, lindas, inesquecíveis, como a amizade
com as pessoas de lá; da minha atração por lugares pequenos, considerando que
nasci num paraisinho do tamanho de uma rua; do futebol que já pratiquei por lá
e até das agitadas câimbras que me renderam gozações; das reportagens que me
embriagaram de entusiasmo sobre empresas e turismo e, principalmente, dos
artigos de pós-graduação que a Estrada Real me inspirou no distrito itabirano;
de seus comícios políticos antológicos, que até hoje, pelas graças dos
personagens, me rendem risos e lembranças; e de fatos reais e interessantes que
ocorreram por aquelas adoráveis e adoradas bandas.
Em um mil
novecentos e não sei quanto, um “maluco de jogar pedra” adentrou a Igreja
Matriz local em que, naquele instante, realizava-se um casamento. Observador,
ficou na espreita do término da cerimônia para fazer não sei o quê. Terminado o
casório, os noivos, felizes e sorridentes, acompanhados por damas de honra,
padrinhos e madrinhas, caminharam rumo à
porta principal, onde, costumeiramente, são cumprimentados pelos presentes. O
doido de pedra e de rasgar notas de cem caminhou na mesma direção e não fez
nenhuma pose, mas avançou e desferiu na noiva um super- beijo. Estalos assustadores
e irreais pulularam pelo alto da ermida. Quando dizem beijos - e beijos são
cumprimentos normais, respeitosos, que já estavam na moda naquele tempo não tão
distante; quando digo super-beijo, esse foi um “erotic kiss”, ou “desentupimento
de pia”, como a ele se referem nas grotas por este Brasil afora.
A seguir ao
barulho estridente do estrondo, foi um
circo de pancadaria. Pareciam as lutas de bandidos nos campos de futebol, ou
arenas, e consistia no desandar de tapas, socos, chutes, caneladas, saltos
mortais, vassouradas e outros tipos de violência desferidos contra o pobre
coitado do tarado, sei lá o que ele era, ou drogado, por praticamente toda a
assistência matrimonial ali presente.
Depois disso, ou três dias após,
como repórter, entrei nas matas dos arredores atrás do casal e pude vislumbrar,
numa localidade, não dois pombinhos em lua de mel, mas em nostálgica depressão.
Nenhum deles quis fazer um depoimento, o choro da noiva continuava jorrando
copiosamente e a deixando de olhos vermelhos e inchados, sua mãe me falou
apenas: “Ela teve uma ‘lua de fel’”. O noivo, por sua vez, pesava a ocorrência
como uma tragédia de fim de mundo. O beijoqueiro, preso, era tomado apenas como
mais um desses malucos que habitam o planeta, hoje chamados de usuários de
droga.
Ocorreram
infinitos outros causos na terra do meu amigo Zé Braz (in memoriam), Zé
Ignácio, Família Geleia, Stael Azevedo, Tangará, Élio Quadrado, Raimundo
Afonso, Ney Azevedo, Eleni, Zé Torrinha, Zé de Assis, Marco Antônio Lage,
Roneijober Andrade, Harcy Lage (in memoriam) e do que compõe o enredo desta
página despretensiosa. O nome dele é Reinaldo Luiz Vieira, dos mais dedicados
empresários da região, verdadeiro membro de uma comissão de frente de
empreendimentos que se destacaram e se destacam no Distrito Sorriso de Daniel
Jardim de Grisolia. Chega de preâmbulo, vou suprimir os novos possíveis rodeios, pedindo licença apenas para uma
pequena abertura.
É o seguinte:
prolifera pela pátria inteira a febre de igrejas evangélicas. Essas surgem mais
pelo deus que a guia, o senhor dinheiro, do que propriamente nos condutos da
fé. A fé — não e nunca a que remove
montanhas, mas que leva o dinheiro para muitos bolsos e/ou contas bancárias — serve
como defesa para os pseudopastores que são isentos até de impostos, de acordo
com a imperfeita, embora seja documento sagrado, Constituição Federal. Mas que
fique claro: os crentes, ou igrejeiros que eventualmente posso citar, não
assino que sejam pobres de espírito, nem burladores da fé, nada disso, nem é
preciso ser desavergonhado para se converter em pastores de ovelhas quaisquer.
Eles são, sim, barulhentos, transgressores das leis dos homens, exploradores de
ouvidos desobrigados de ouvidos alheios.
Em Aliança
, foi instalado mais um templo
evangélico. Como muitos por aí, perturbam a paz, embora digam que pregam e até
trazem a paz. Perturbam crianças que precisam dormir porque nasceram ontem e
outras com horário marcado para chegar à escola; perturbam idosos que têm
contas a prestar ao seu bem-estar; perturbam os doentes que, além do que
sentem, nervosamente, ficam de sono perdido em seus leitos de dor; enfim,
perturbam o ser humano normal e, mais ainda, turistas que saem para conhecer o
distrito que mais segue os preceitos históricos e turísticos da Estrada Real.
No meio de tudo,
tem um ser humano feito à imagem do que deveria ser o homem: corajoso, assumido, correto, sério,
zeloso, criterioso e cidadão. Reinaldo da Pousada do Rei, ou da Pousada
Quadrado, além de ipoemense, sonha com o progresso de seu torrão natal. Ele
deixou o trabalho a que dedicou em outro estado brasileiro e retornou ao antigo
berço para abrir oportunidades econômicas e turísticas, em atos que mais
demonstram o seu amor patriótico do que, especificamente, empreendedor. Para
construir e abrir perspectivas ao turismo local, Reinaldo começou trabalhando
no mais vermelho das contas negativas. Frequentador de gabinetes de executivos,
políticos, deputados, governadores, ele tem sempre uma pasta às mãos
direcionada a um objetivo: construir algo para Ipoema. E vai obtendo sucesso nesse
trabalho incansável.
Ele pediu aos
dignos evangélicos — repito que não sei nem tentei apurar se são mais uma “pilantraria”
que assola o Brasil, porque não me interessa — mas que agitam os ares da rua
principal do distrito. Reinaldo, na sua quase infinita paciência, tentou um
acordo com as vozes que pregam naquele templo e que até se tilintassem no
deserto incomodariam. Não obtendo êxito, partiu para a Secretaria de Posturas
Municipais, em Itabira, sabendo, de antemão, que há uma inquestionável
desobediência às normais posturais. Enquanto os zeladores dos sons contra os
malditos decibéis que atacam os nossos tímpanos vão tentando consertar o que
está a mil quilômetros da paz, ele recorreu a uma mensagem de alerta, com lembrete
realmente combinado com a filosofia bíblica.
Eis a faixa que,
acredito, lá no Céu, Deus abençoou:
“JESUS
PREGOU PARA MULTIDÕES
SEM
PRECISAR DE GRITAR.
PEDIMOS
EDUCAÇÃO,
POIS
JESUS NÃO É SURDO.”
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