O Galo sofreu
amargamente nos primeiros anos do novo estádio, mas conseguiu se recuperar a
partir do fim da década de 1960, ultrapassando um período em que reinou com
grande vantagem quando manteve os craques Reinaldo, Cerezzo, depois Nelinho,
Éder, Palhinha, Vaguinho juntos deles. Foi nesse período que me tornei um
frequentador assíduo do Gigante da Pampulha e, como pesquisador por conta
própria, tentei entender a mágica da torcida do Galo. Certa vez entrei no não sei
bem a data, estávamos na década de 197. Vi o Galo levar dois gols do Santos em jogo do
Campeonato Brasileiro. Termina o
primeiro tempo, o placar se mantém inexorável, irredutível e doloroso.
Quando começa a
etapa complementar, eis que a torcida recebe o time em grande festa e me deixa
pasmo. — O que foi que aconteceu? — perguntei a um atleticano ao lado e ele
nada me respondeu, apenas sorriu e tocou o bonde para frente, enquanto a
barulhada só aumentava, embora o gol não saísse. Mas, não tardou tanto diante daquele
estrondo ensurdecedor. Aos 35 minutos do segundo tempo já estava em 2 x 2. E
mais um pouquinho de minutos lia-se no placar eletrônico: Atlético 3 x Santos
2. Termina o prélio. Para a torcida, tudo normal.
Inúmeras vezes
vi essas mágicas acontecerem e passei a pensar que havia energia de reserva,
escondida, pronta para vestir a camisa preta e branca, e jogar a favor da
equipe. Se bem que os cronistas mais lidos na época, Roberto Drummond (que
também passou por Guanhães, atleticano, ao contrário de Márcio Prado, guanhanense
e americano até morrer), Xico Antunes, que tive a satisfação de ter no meu convívio e assimilado ao seu jeito
diferente de escrever. Mas lia também cronistas cariocas, acompanhando o futebol
do país inteiro, mantendo-me fiel à leitura de Ari Barroso (flamenguista), João
Saldanha (botafoguense) e Nelson Rodrigues (fluminense).
Vendo, ouvindo e
acompanhando todos os times brasileiros, não me faltou a ideia da comparação. E
aí a paixão pelo Galo só cresceu, e tão forte que ajudou a formar a cabeça de
praticamente toda a minha família, incluindo
cinco filhos e noras e genros. O meu avô Seraphim Sanna, filho de
italianos, que me tratava como uma peça de diamante, certa vez me disse: “Vou
levar você a Ouro Preto, onde ouvirá do meu pai a história de sua vinda para o
Brasil”. Com 6 anos de idade, às vésperas de ser matriculado no Grupo Escolar
Dr. Odilon Behrens, em São Sebastião do Rio Preto, foi que me assentei em uma
das escadas do casarão da Rua do Pilar, naquela cidade histórica, para ouvir
atentamente a história real que aqui não vou repetir agora, da conquista do
coração de nossos antecedentes pelo clube que já era meu, o Galo.
Alguns
cruzeirenses acham que agora os atleticanos exageram em comemorar o título de
campeão da Copa do Brasil que, para alguns, é “copinha”. Não era quando o time
deles fez as suas quatro conquistas, mas... deixa pra lá. Para vencer a
Copinha, o Galo virou um placar de 2x0 em cima do Corinthians, depois do
Flamengo, pelo mesmo troco, 4 x 1, depois de eliminar o Palmeiras,
aplicando-lhe duas derrotas. Vejam bem e olhem a trajetória do outro time que
teve como adversário forte um tal de ABC na
semifinal (não estou brincando, confiram), talvez representante de
jogadores semi-alfabetizados. A glória da virada não teve o Cruzeiro, que
sofreu com um 2x0 inicial do Galo, mas não reagiu no segundo jogo porque... deixa pra lá também porque
a torcida do Atlético não ensina segredos para rivais.
A mística da
camisa e do escudo simples guardam segredos misteriosos. Em seu livro “Atlético
Mineiro, raça e amor”, de Ricardo Galuppo, o autor conta mas não tem como revelar o
porquê da relação de amor do clube com a sua torcida. E Roberto Drummond acabou
cunhando para ele uma frase que vale por toda a eternidade alvinegra: “Se
houver uma camisa preta e branca pendurada num varal durante uma tempestade, o
atleticano torce contra o vento”. Se
alguém quer entender, não o que Drummond quis mesmo dizer, mas a simplicidade
do atleticano que acorda em momentos decisivos na hora do jogo, vai ter que fazer muito mais do
que fiz, coletar informações e torcer sempre com a mesma crença. Piazza
reclamou com Chico Pinheiro que a torcida do seu time, o Cruzeiro, que defendeu
com galhardia e brilho, simplesmente torce, mas não vive. É, de verdade, um
grupo de simpatizantes.
Fica aqui a
minha homenagem ao Galo Forte e Vingador por essa conquista inédita, que vale
muito mais que as quatro copas do rival. Vale porque quem torce para o Galo é fidelíssimo,
agradecido, vibrante e não desaparece quando vêm tormentas maiores e
enganadoras. Vale porque tirou duas casquinhas saudáveis no rival que se achava
com toda a arrogância um time imbatível. Depois de tempestades de vento que
ameaçaram levar a camisa de que Roberto Drummond imaginou pendurada num varal e
relatada em sua página gloriosa e
inesquecível, esse Galo está pronto para outras ventania, tormentas e
conquistas.
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