terça-feira, 19 de outubro de 2021

FALTAM 4 DIAS PARA A “DATA D” DO CENTENÁRIO DE DOM MÁRIO: POLÍTICA, SEQUESTRO E MULTIDÃO

É claro que Dom Mário Teixeira Gurgel não era um santo. Claro também que tinha os declarados “inimigos” políticos. Ele mesmo contou que uns próceres da vida pública itabirana foram a Brasília pedir a sua saída da Diocese. Temos este e outros  casos ou causos a narrar agora. Entre os outros, um tal sequestro, negado por ele, além de uma tarde inesquecível no Estádio Israel Pinheiro.  

Com certeza,  dirão os céticos, os quais existem às  dúzias, ou resmas, que o prelado nordestino-itabirano tinha as suas preferências partidárias e derrubava candidatos até considerados invencíveis. Vamos acreditar que tal crença seja verdadeira. Para tentar descobrir o segredo, fiz com ele uma série de entrevistas, algumas publicadas na imprensa local.

 

DOM MÁRIO, UM  POLÍTICO?




A pergunta seguinte partiu de um jornalista e a presenciei, bem como a resposta: “Dom Mário, o senhor demonstra explicitamente que tem simpatia por um fulano candidato; é verdade?” Ele: “Fujo definitivamente de levantar polêmicas, mas se me provocam me torno mais claro na resposta; declaro com todas as letras: é lógico que tenho os meus candidatos preferidos, mas somente Deus, a urna e eu sabemos quais são” — eis aí a sua réplica. 

 

DOM MÁRIO SEQUESTRADO?

 

Em outro tema, a pergunta partiu de mim: “O senhor foi sequestrado um dia ou tentaram raptar o senhor depois de uma missa celebrada da Catedral Diocesana de Itabira?” Resposta: “Não tenho conhecimento deste fato, até porque não sou celebridade sequestrável. Pergunto: haveria resgate e qual  ou quanto seria? Que vantagem levaria o sequestrador por manter-me em  um cativeiro? Concluo, então, que não tem fundamento  esse rapto imaginário”.

Outros fatos ocorreram e  tenho sugestões de amigos dele  propondo-me continuar narrando a história do clérigo. A proposta tem um aceite, desde que possamos montar um grupo e esse trabalhar com afinco.

 

DOM MÁRIO EM DIA DE GLÓRIA

 

E vou contar um fato em que fui um coadjuvante. Briga entre nós — sim, ele, o cara e eu o insignificante — fizemos sair faíscas de palavras no ar. Teimoso e  interessado na verdade, fui rude publicamente ao trocamos farpas metafóricas. Segui um conselho dado por ele mesmo, até que Deus transferiu o eterno lema de sua vida, suponho — “como aquele que serve” —para alguns minutos de minha vida.

Tentando resumir: Silvério Bragança, seu amigo número 1, nomeado por ele próprio, o bispo Dom Mário, liga-me e me convida para filmar o Dia da Diocese, evento anual celebrado por todas as paróquias. Tarde de domingo, 22 junho de 1986, 21 anos da Diocese e um outro marco na família do titular .

Aceitei o desafio, era dos poucos que tiveram acesso ao centro do gramado do Estádio Israel Pinheiro. Vinte mil ou mais católicos se acotovelavam nas arquibancadas. Momento máximo da festa: Dom Mário fala, ao vivo, com sua Mãe, Ana Alda Teixeira Guedes, que estava, como sempre, no Ceará. A multidão caiu no delírio como se fosse um gol épico do Valeriodoce contra o Botafogo, fato ocorrido em 17 de fevereiro de 1957 no mesmo palco.

Nos alto-falantes ressoava o carinho de Dom Mário pela  genitora que, coincidentemente, fazia aniversário: “Mamãeeeeeeee”, soltou ele retumbantemente a voz, que percorreu todas as fontes auditivas ali presentes. Registrei tais  momentos e este especialmente, dobrei-me, de joelhos ou deitei-me na grama, no palco, no alambrado,  em busca de todos os ângulos possíveis. Num instante ele, depois de alguns meses de inimizade, sorria para mim, convidando-me a viver em paz, como se traduzisse o seu gesto floreado de sorriso pacífico.

 

DOM MÁRIO: “VOCÊ É UM CRISTÃO”

 

A festa terminou, edito a fita e guardo-a, esperando o momento certo. Ligo para a residência do bispo uns dias depois.  A resposta vinda da casa episcopal: “Pode vir hoje às 15 horas”. E assim aconteceu. Mas não entrei, preferi entregar o objeto todo fechado num envelope a uma funcionária da casa. Outro telefonema: ele me chamava para ver a fita com ele. Tremi todo.

Marcamos a data e, novamente, encaminho-me à residência do prelado. Convida-me a uma sala. Liga a TV e o videocassete. Assistimos em silêncio, que parecia, em cada momento um grito de emoção. Para os costumes da época, era  eu um emérito carregador de câmera. No momento da fala dele — “Mamãeeeeee” — agradeci a Deus por eternizar a sua felicidade. Gratificante.

“Eu não vou agradecer pelo que você fez, mostrando a sua humildade no esforço de  filmar um momento importante de minha vida.  Gesto muito espontâneo, muito bom  que retribuo assim: “Você é um cristão legítimo!” Se eu já estava mudo, fiquei engasgado.

Instante de ir embora, depois de um café bem acompanhado. Ele me abraçou e repetiu as palavras, atribuindo-me o título benemérito de “cristão legítimo”. Também não respondi, não agradeci, nada fiz. Mas tinha a certeza de  que naquele momento nascia uma grande amizade.

A afetividade duraria, como durou e dura,  para sempre.

José Sana

Em 19/10/2021

Foto: Arquivo (Dom Mário em São Sebastião do Rio Preto)

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