sábado, 16 de outubro de 2021

FALTAM 7 DIAS PARA A “DATA D”: “USE LIMÃO NO LUGAR DE SAL”, DIZ O BISPO DOM MÁRIO AO SEU MOTORISTA

O telefone toca, atendo, e era um pedido, ou melhor, uma ordem. A ligação vinha do inseparável amigo de Dom Mário durante anos a fio, Silvério Bragança. Ele me pergunta se estou ocupado às 20 horas. A resposta: “Estou, mas não estou; ou melhor, faço-lhe uma pergunta: “O que me propõe fazer?”. Ele: “Às oito da noite você pode buscar Dom Mário em sua casa e levá-lo a um tal lugar?” (“Esse tal lugar” não vou revelar, desculpe-me quem eventualmente me lê). Outra resposta e minha afirmação: “Pode deixar que farei o que pede, com muito prazer”.


Dom Mário, com Silvério Bragança, saindo do hospital: última foto do Bispo, de Júnior Sana

 

Às 19h45 estava eu em frente à Igreja de Nossa Senhora da Piedade, no Bairro Campestre, já aguardando o bispo, que também não se atrasa. Dom Mário entra no carro e, depois dos cumprimentos protocolares, bombardeio-o de perguntas, entre as quais esta: “O senhor sabe aonde vai?” Ele responde: “Sei sim, é num tal lugar assim, assim, assim”. As perguntas continuaram de mim para ele que até mais tarde preocupou-se com elas. Deve ter questionado de si para si: “Este moço nunca conserta!”

 

Seguimos com calma a curta viagem. Num minuto, chegamos ao destino proposto. Parei na porta do tal lugar e ele me pergunta “Você não vai descer?” Respondo-lhe: “Não”, e acrescento que o Silvério ficou de cumprir a essa tarefa daqui a aproximadamente uma hora. Ele, então, tenta rasgar um meio-verbo: “Quando você puder e caso queira, vá lá à minha casa que preciso conversar com você”. Ok, dei-lhe a resposta ao assumir a perplexa e impaciente curiosidade, tanto que no dia seguinte atendo o seu pedido, toco a campainha no horário mencionado como possível, às quatro da tarde mais ou menos.

 

Ele me acolhe sorridente ao abrir a porta e me aponta uma cadeira: “Você veio depressa demais! Pelo seu jeito, acho que não dormiu bem” (rs... rs ... rs...). Achei graça na frase e fui ao possível assunto logo ao ocupar a cadeira: “O senhor está me condenando porque fiz uma condenação?” Ele, que não era nada bobo, retruca: “Não estou condenando porque não condeno ninguém; aliás, a questão clara é que você ficou se estranhando  por eu ir dar a bênção àquela casa”.

 

Fez bem clara essa explicação, ainda mais extensa, que aceitei como fantástica.  Realmente, me intriguei com aquela bênção um pouco fora do padrão que eu seguia. Preferi não queimar  as mãos e a língua, economizo essa manifestação. Registro o seu maneiroso esclarecimento: “Olha, já foi o tempo em que os padres e bispos deixavam até de visitar os que estavam na boca do povo como maus; hoje, não, o esclarecimento que temos está no Evangelho, sintetizado assim: ‘não julgueis para que não sejais julgados’; fique tranquilo que só queria lhe dar uma orientação e digo que não faço parte de nenhum conselho de sentença”.

 

Fecha assim o prelado a conversa que parecia fora do contexto: “Não coma sal; evite essa malícia; use limão em seu lugar e nunca mais reclamará que a comida está destemperada”. Realmente era verdade, sal é veneno e pode ser substituído, principalmente porque requer muita água como o julgamento sugere um incômodo de consciência.

 

Abraçamo-nos,. Que lição esplendorosa tive naquela tarde! Considero-me  um privilegiado por receber tanta graça! Nunca mais esquecerei, embora possa errar porque esta situação é humana. No meio da conversa havia lhe perguntado: “Silvério buscou o senhor?” A resposta veio na ponta da língua: “Buscou, sim, ele nunca falha”. Mais uma pergunta: “O senhor receitou-lhe limão no lugar de sal para ele?” Seu imediato retorno: “Ele já sabe”.

 

Conclusão: sou um ser humano teimoso e pecador, é claro que sou, mas um conselho sigo ao pé da letra: evito o sal, tanto de cozinha quanto do dia a dia desde aquele belíssimo diálogo.

 

José Sana

 

Em 16/10/2021


OBSERVAÇÃO: Contagem regressiva do Centenário de Dom Mário Teixeira Gurgel está sendo publicada no Facebook de José Sana.

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