segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

"JUSANTE É A MÃE!"

Eu atravesso a rua e vejo um amigo que diz me ler em todas as minhas baboseiras escritas ou rabiscadas. Ele fala, explica, quanto mais tenta se ajeitar, mais se enrola. É um dos leitores mentirosos que tenho. Ou melhor, mentiroso sou eu, ele apenas faz parte do rol  daqueles que gostam de agradar. Ele se mostrava completamente do meu lado mas na contramão dos meus pontos de vista. Então, não era um leitor.

Abri esta coluna de hoje para dizer que não eu mas outros precisam ser lidos, embora quase ninguém é visto, sequer em manchetes. Daí o meu consolo e, ao mesmo tempo, tristeza atroz. As pessoas precisam ler não somente os textos, principalmente, livros bons e cheios de histórias verdadeiras, literaturas fantásticas. Para se formar uma identidade coletiva é preciso que ela comece individualmente e sejam vistos, estudados, pesados, milhares de lados. O mundo é vasto. Ainda estamos numa fase em que há seres deduzindo, concluindo, vendo apenas o cheiro da notícia. Em poucos minutos de deduções  estufam o peito para dizer que são sábios, “os intelectuais do Google”, como os qualifica um amigo meu.

Se ninguém me lê, talvez uns gatos pingados sejam exceção, e hoje peço encarecidamente que façam isto: acreditem que a Barragem de Itabiruçu não tem segurança. E parem de acreditar em conversa de “montante” e “jusante”. Esse papo só serve para fazer boi dormir. Afinal, estão em jogo 120 mil almas perdidas e achadas. Se aprenderam algumas lições...



A questão que leva o ser humano à falta de interesse por informações extraídas do fundo de suas origens (não me canso de dizer que todo fundamento está na causa, não há efeito sem causa) acrescenta a esse cidadão, em sendo ele itabirano, uma situação um pouco mais complicada, porque esse notório morador de nossa terra é um inerte.

Para explicar a passividade da gente de Itabira, recorremos a um levantamento  feito pela ilustre autora Maria Cecília de Souza Minayo, que já mostramos e continuamos mostrando, ao lado de outros pesquisadores históricos, em Documentário, no sexto capítulo:  “Como se pode depreender  de diversos depoimentos dos trabalhadores, Itabira, na visão deles, ‘é coisa de itabiranos’, dos quais eles se excluem”. Acrescenta; “Os filhos desta  cidade são preguiçosos, sem iniciativa”. E mais: “Isso aqui vai voltar ao que era porque os itabiranos não se interessam, não têm garra”.

No mesmo capítulo de Documentário, revelei a presença da ex-primeira-dama francesa, Danielle Miterrand, em novembro de 2006, em Itabira, quando sobrevoou a cidade num helicóptero cedido pela Polícia Militar. Ela ficou estarrecida com a paisagem que viu: “Vi buracos, imensas crateras e não posso compreender como essa população de cem mil almas consegue viver calmamente entre tantos problemas”. Agora, numa pergunta minha: e Mariana? E Brumadinho? E Itabira? E Itabiruçu?

Vou encerrar por aqui tentando explicar em duas palavras o que os seres humanos daqui andam afirmando ser o significado de jusante (barragem segura) e montante (barragem insegura). Prometi a alguns amigos que não revelaria o que sei sobre aquela bomba atômica que rodeia Itabira, denominada Itabiruçu, a Bomba Itabiruçu. Por enquanto vou apenas me desabafar e imitar aquele conhecido ceguinho humilhado: “Jusante é a mãe!”

José Sana

Em 04/02/2019

Um comentário:

  1. Concordo com você.
    Lamentável o descaso das autoridades constituídas do município. A omissão de alguns pode causar a morte de milhares.

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