terça-feira, 23 de outubro de 2018

HIPOCRISIA: O MITO ESCONDIDO DA ELEIÇÃO PRESIDENCIAL

Hipócrita era apenas um ator, um comediante, um histrião, sem as conotações intensamente negativas – de falsidade, dissimulação, fingimento – que hoje estão grudadas nela. Ou melhor, o fingimento estava lá, mas era exercido em nome de uma causa nobre, a de entreter o público. 

Depois o hipócrita virou um praticante da hipocrisia, que é o ato de fingir ter crenças, virtudes, ideias e sentimentos que a pessoa na verdade não as possui. A palavra deriva do latim hypocrisis e do grego hupokrisis, ambos significando a representação de um ator, atuação, fingimento (no sentido artístico). Essa palavra passou mais tarde a designar moralmente pessoas que representam, que fingem comportamentos.

Seja como for, é certo que ao desembarcar em português no século XIV a palavra hipócrita já trazia consigo, pronta, a acepção que hoje vemos atribuída com frequência a políticos e outros fingidores. Hoje é palavra-chave para quem a detecta, fica sempre embutida em algum sentimento de quem a usa. Praticamente, todos os termos ruins da política, da justiça e da oratória se sustentam na hipocrisia.

A tecnologia conseguiu produzir um monte de detectores mas ainda não chegou ao exame de avaliação da hipocrisia humana. A psicologia arrisca em autuar um hipócrita até em flagrante, deitado num divã, mas não assina, com absoluta certeza, de que aquele filho de uma mãe deitado diante de si mente, finge, força a vontade, ou é hipócrita, mesmo de leve.



Eleições são instantes de grande profusão da hipocrisia. Tanto os candidatos quanto o eleitor sabem que estão usando uma condição que moveu o Nazismo e o Fascismo, que empurra a demagogia, que sustenta o marketing e até elege grandes falsificadores. Vejam na eleição atual. Segundo a mídia, o deputado federal Eduardo Bolsonaro teria dito, oficialmente ou não, no Congresso ou na rua, num boteco ou velório, na esquina ou na barbearia, a seguinte frase: “Basta um cabo e dois soldados para fechar o STF” Na verdade, ele quis, ingenuamente, repetir Jânio Quadros, depois de sua renúncia à presidência da República, em 1961, que confessou a um repórter: “Ter-me-iam bastado um cabo e dois soldados para fechar o Congresso.”

A frase bolsonariana rendeu e ainda rende uma mil resmas de papeis escritos e falados, impressos ou não para quem está querendo tentar mudar o resultado de uma provável eleição de Jair Bolsonaro no próximo domingo, dia 28 de outubro. Declaradamente, a Rede Globo, o jornal Folha de São Paulo e o site Uol se juntam para se livrarem de um governo que lhe pode prejudicar nos próximos quatro anos. É ridículo. Ridículas são muitas outras posições. Já o candidato Fernando Haddad, que seria o principal interessado, agarra-se a este propósito para revirar a mesa ou a cabeça do cidadão. O mesmo esforço foi feito com a confusão do WhatsApp, aplicativo da internet que espalha, em questão de segundos, mensagens para todos o quadrantes da Terra.

Hipocrisia, venha cá e se apresente. Diga por que você, hoje, é a palavra-chave do momento, ou melhor, o mito escondido desta eleição. Abra o coração e o verbo e confesse para o mundo o porquê de sua existência. Explique a razão fundamental que permitiu que estes fatos — derrame de WhatsApp, fala de Eduardo Bolsonaro e outros factoides  —  sejam tratados como se fossem a bomba de Hiroshima pela imprensa que martela o fato como lhe convém. Imaginem que Lula, Zé Dirceu e o deputado Wadih Damous já disseram frases parecidas e que não saíram nem em rodapé de jornal.

Isto eu aprendi nos corredores e salas de jornais e revistas nos quais trabalhei desde os 18 anos: “O mundo acontece lá fora e tem pouca importância. Aqui dentro nós pegamos a notícia, que precisa existir, e vamos dar-lhe a dimensão que queremos, e também arquivar aquela que nada acrescenta ao nosso interesse”. Desde quando comecei no jornalismo, de proveitoso nas lides com falsidades ou não, só aprendi que um cão morder um homem não é notícia, mas, o homem morder um cão pode render uma manchete de primeira página. 

Fora da anedota canina tudo é hipocrisia.

José Sana
23/10/2018

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